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quarta-feira, 15 de abril de 2020

Gestão além das cifras - o emaranhado de indicadores


Controlar os investimentos, prospectar verba, planejar execução, mensurar resultados, acompanhar execução. Todo gestor conhece bem as diversas ferramentas disponíveis no mercado, as mais ousadas, usuais e as de difícil manuseio, tudo para gerar relatórios e leituras das cifras que perpassam a área em questão. Estas medidas devem incorporar o planejamento da área de comunicação e nortear a maneira como são estruturados os fluxos e plataformas.

O clichê é verdadeiro: não há fórmula soberana. Os gestores precisam ter a consciência do resultado esperado de suas ações e quais as métricas e modo de avaliação de indicadores se encaixa no fluxo de validação da performance da respectiva área. Parece, e até mesmo é óbvio, mas muitos deixam a desejar no mercado. No que concerne à comunicação, a variedade de indicadores, perfil de interpretação, fórmulas e estimativas confunde as organizações e geram relatórios vazios, cheios de números e correlações rasas. Caso quem esteja acima do gestor (Diretoria, por exemplo) não entenda de comunicação, tampouco compreenda a complexidade da leitura dos dados gerados e análises nos relatórios, cabe ao gestor "guiar e ensinar" a chefia pelo caminho da interpretação dos dados, do desdobramentos das estratégias e tomadas de decisão. A ineficiência padrão tem gerado custos desnecessários, ações sem foco, e resultados superestimados, que desdobram-se no máximo em um tapinha nas costas, ao invés da maturação dos processos de comunicação, relacionamento institucional e consolidação da marca da empresa. Além de planejar, faz-se necessário acompanhar de perto, com visão de paisagem e de detalhe.

Uma breve análise do balanço financeiro da organização, possibilita constatar a performance dos índices de solvência (Liquidez Corrente / Liquidez Imediata / Liquidez Geral) e entender se estão em uma situação favorável, com solidez financeira. Simultaneamente, o valor investido em comunicação deve ser desmembrado por aspecto de investimento e correlacionado com a receita x despesas gerais da entidade e também da natureza de gasto de P&P.  Conseguinte, deve-se identificar e ajustar o grade que a comunicação ocupa na composição orçamentária da organização; seja em lastro variável ou pré-estabelecido, compreendendo o perfil de influência interna.

A mensuração dos resultados  das ações de comunicação, então, deve evoluir (ser maturada a partir de análises sérias e interrelações) e assim ser integrada à leitura do investimento e gestão orçamentária, resultando em estratégias (macro e microuniverso), redefinindo ou mantendo o posicionamento da empresa, em um processo vivo, pujante.


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quinta-feira, 31 de outubro de 2019

Varejo e varejeiras


Ideias delineiam os rumos das ações que interferem na organização social. É óbvio, mas apenas quando se pensa na generalidade deste aspecto. No entanto, quando pensa que a ideia em questão pode ser sua ou da sua empresa, a situação, sensação e atitude mudam. E logo começam as cobranças por audiência, por índice de percepção e retenção da mensagem, de valor da imagem e tantos et ceteras que nem quem pede sabe ao certo como interpretar e pior, nem sabem como estruturar planejamento estratégico e ações efetivas após análise dos dados. Sobre a mensuração e as complexidades que envolvem o tema comentarei posteriormente.

Antes, é interessante olhar de forma sutil para a forma e o conteúdo. O que informar e como informar... volta e meia esta mosca incomoda e pousa à frente das redações, públicas, corporativas e midiática. No que concerne ao ambiente corporativo, é fundamental não simplificar demais as mensagens e não banalizar as plataformas disponíveis, pois se quanto mais comodidade, mais preguiçoso fica o leitor (de texto / áudio / vídeo), o uso desequilibrado das ferramentas. Exemplos são vários. Antes ficávamos muito tempo assistindo a vídeos... os institucionais tinham 15, 10 minutos... depois reduziram para 5.. e agora, os indicadores de quem assistiu pelo menos alguns segundos da mensagem já despontam em relatórios de mensuração. Cada vez mais seletivo no universo expandido de conteúdos, o leitor (usuário) não assiste a vídeos longos caso não seja de extremo interesse.

Sociedade de vanguarda, a pseudo liberdade. Clamam, reclamam por divulgação, mais informações, mas não elavam o índice de leitura, não leem a quantidade exorbitante de dados que está disponível sobre os mais variados assuntos , seja na internet, nos livros e nas praças.  Não leem, despejam nas ruas o livo de folders, jornais e afins. Paradoxalmente, alimentam a reclamação por "divulgar mais e melhor". Reclamam que não há divulgação e não se envolvem com a ampla divulgação que existe. Não buscam. Querem, como filhotes de passarinho, receber o conteúdo já mastigado, regurgitado em suas mentes autômatas. Neste cenário, o lobby dos setores privados e públicos nada de braçada, construindo pós verdades, alimentando todo tipo de vaidades e consolidando fontes, desacreditando outras. O resultado é uma série de veículos de comunicação defendendo estandartes que nem de longe revelam os fatos, os interesses e desdobramentos correlatos. A comunicação  e o relacionamento institucional no varejo, com pensamento de atacado. Geralmente, o reflexo natural é espantar com um tapa as varejeiras, ignorando as ovas prestes a eclodir. Isto é óbvio, acontece há décadas, irremediável, quando se pensa na generalidade do tema. Contudo, torna-se preocupante quando analisada regionalmente, inclusive pensando qual o "seu" lugar e função no cenário.

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quarta-feira, 10 de outubro de 2018

Espaço como experiência


A criação de significados e significantes (individuais e coletivos) opera os mecanismos de reputação que equilibram os fluxos sociais.  Desorientado, o indivíduo em um mundo globalizado busca por referência em seu repertório e ao redor, para lidar com a nova configuração do pacto social. Uma globalização de recursos, de potenciais, de demandas e das mazelas; que gerou integração e sobreposição de culturas e mercados. Integrou-se assim os fluxos de apropriação territorial e estruturação dos padrões sociais, reverberando nos processos de comunicação.

No entanto, o âmbito das decisões pertence a uma microrrede (escala local) e a distribuição / padronização destas decisões transcorrem por uma macrorrede (escala global). Neste cenário, faz-se necessário compreender o espaço dos fluxos e o espaço dos lugares, para assim entender como atuar (interagir e influenciar).

A estrutura do emissor - mensagem  - receptor - significante ganhou complexidade sob o aspecto do tempo, uma vez que os receptores são emissores em potencial. narradores e consumidores, sem necessidade de um meio oficial. A multiplicidade de plataformas, linguagens e audiência mudaram a paisagem. Cada indivíduo é um epicentro social de interação (estrutura e fluxos em rede). Neste ínterim, a evolução e desenvolvimento  geram e alimentam a crise constituindo um movimento em onda. O movimento em onda do sistema trouxe uma nova configuração social de empoderamento e desequilíbrio.

Uma paradoxo pode ser observado. A Sociedade busca no dia a dia mais comodidade [espaço para crescer] - Desenvolve tecnologias, muda forma, comportamento e conteúdo das narrativas [empodera o consumo / crédito / poder - nova sociedade] - Gera crescimento, Desorientação e Dívida [instaura crise] = A Sociedade busca no dia a dia mais comunidade [mudança - renovação de ciclo].

Assim, a relação dos indivíduos com o tempo e espaço deixa de ser apenas algo na dimensão física. Antes de conceituar os espaços como público ou privado, é importante olhar tanto de longe (visão de paisagem) quanto de perto. Conforme discorre Manuel Castells em sua obra (Sociedade em Rede), a percepção do indivíduo sobre espaço e tempo alcança a dimensão da experiência, da vivência. Estrutura e função conforme as redes.

Acompanhando a ideia do espaço enquanto experiência, tem-se o espaço dos fluxos como algo na dimensão do Poder / Relações Sociais / Transição de paradigmas / Ambiente do Ator Social. Os espaços dos lugares configuram-se onde há Significante Cultural / Ambiente do Indivíduo.

A partir desta renovada leitura sobre os aspectos contemporâneos de organização social, pode-se  obter uma visualização mais apurada da territorialidade e com isso construir de forma mais assertiva as estratégias de atuação enquanto ator (ser) social de forma a proteger-se enquanto indivíduo.



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quarta-feira, 15 de agosto de 2018

entre todos



A comunicação, seus conceitos, plataformas, mecanismos, ferramentas, perpassam a sociedade e respectivos fluxos. As entidades e organizações aparentemente evoluíram do senso comum (onde todos sabiam opinar sobre comunicação), seguido da segmentação (onde só o setor de comunicação era responsabilizado por comunicar) à maturidade de todos assumirem sua participação no processo narrativo das instituições. Entretanto, para isso fluir de uma maneira efetiva, contribuitiva, a capacitação é fundamental.

Neste sentido, profissionais das mais diversas áreas têm buscado cursos de especialização em comunicação, no intuito de se inteirarem com as possibilidades e prospectarem crescimento na carreira.

Do privilégio à necessidade, a comunicação - tão natural à sociedade - passou a ser percebida como processo básico e estratégico na manutenção das organizações. Além de estar antenado às mudanças tecnológicas, é preciso ir além do deslumbramento e absorver essas mudanças no seu dia a dia, transformando seu olhar e suas atividades.

Deseja-se que os trabalhadores possam assimilar as mensagens, apropriar-se da linguagem e multiplicar a narrativa corporativa, instituindo-se como um empregado engajado. No entanto, é importante estar ciente de que caminhos não são receitas.

Simultaneamente, deve-se atentar à comunicação como instrumento de transformação organizacional, não resignada ao plano de ação de um setor, mas interiorizado em cada indivíduo, como uma habilidade e não uma função. Se as empresas conceberem a comunicação como uma competência, devem para estimular seu exercício, criar ambientes de diálogos possíveis, onde os atores sociais possam falar e ser ouvidos. Ultimamente, as empresas têm usado as Redes Sociais Digitais para possibilitar este diálogo. No entanto, muitas deturpam o diálogo, excluindo ou ocultando falas desagradáveis para a empresa. Não se deve fazer isto, pois desconstrói a credibilidade da plataforma de diálogo. Caso não seja possível responder, posicione de forma a deixar claro que respeita a opinião do outro, ou até mesmo a deixe sem resposta, mas não apague. Neste campo o silêncio já é uma frase pronta.

A falta de abertura para participação dos líderes de comunicação em reuniões estratégicas do negócio das empresas, é um indicador da maturidade organizacional para comunicação e da relevância da área para a empresa. Este é um dos entraves de evoluir a área de comunicação de algo técnico e operacional para  uma área no coração da instituição.

A expansão de repertório faz-se necessária para oxigenar o cenário comunicacional. Esta expansão por sua vez, vem por meio do consumo cultural? Ou o referido consumo tem como fim a saciedade do sujeito; tendo como desdobramento as alterações de repertório.

Fato é que o monitoramento e avaliação de resultados deve acompanhar a evolução das plataformas, conceitos e modelos de produção (lembrando aqui também da cocriação). O Communication Controlling (ou Communication Performance Management) precisa ser maturado nas empresas de forma a possibilitar mensurações confiáveis e úteis na definição das estratégias de comunicação.

terça-feira, 3 de julho de 2018

sangria



Era a sangria de um dia frio. Ele não sabia se o gosto do café era prosa ou verso. Bebia descomedido, em copos. Os acontecimentos ao redor não tinham corpos. Apenas fluxos.

"Eu vou comer realidades para cagar suas ilusões". Comer realidades; defecar suas ilusões. A congestão da alma ao tocar o espelho no balanço do vento que me revela. A sanidade de outrora agora convergira na atrocidade de palavras ácidas (será algo que comido foi?) e olhares ávidos por aconchego. A paz que excede o entendimento vem no alento que ultrapassa a rima. As pegadas da madrugada não deixam marcas, nem quando do céu desce orvalho, cobrindo-nos. Nus.

O que foram dedos entrelaçados de mãos cansadas, tornaram-se o monumento soterrado no canto da sala, onde nem as aranhas arquitetam.

Passado está o tempo das encruzilhadas. Momento sutil onde todas as possibilidades estiveram pujantes, latentes, extremamente atrativas e com potencial de sucesso. Feita a escolha... o caminho continua e você apenas vê, numa paralela que se afasta em outra dimensão, aquilo que fora possibilidade e que agora é uma pintura viva na paisagem. O vento à face é um virar de páginas em que percebemos por um instante a sobriedade de seguir.

As ilusões diárias são nutridas para distrair o indivíduo continuamente e abstê-lo de refletir sobre sua passagem no tempo e não a passagem do tempo por ele. O automatismo que garante a fluência social é a trava para a evolução buscada.

Cada momento ruminado, na certeza de que se apressado ou lento tudo acontece, ou não. Assim, a caminhada, pensada e repensada no caminhar pode revelar que os rumos, os tempos, os fins, finais e inícios são apenas aspectos, pontos de referência em uma teia que vai além das três dimensões, do mecanismo de criar e sobrepor padrões; da dinâmica de gerar e se entrelaçar aos significantes.

A digestão das ideias, a congestão dos sentimentos. O sono aconselha o inquieto enquanto reorganiza os móveis dos questionamentos no salão dos ideais do amanhecer.



sexta-feira, 21 de outubro de 2016

polegares em riste



Geração dos polegares frenéticos. A dor de polegar tem incomodado mais do que a de cotovelo. Pescoços baixos fazem reverência a uma privacidade que brilha intermitentemente nas telinhas às mãos. A ergonomia é o novo desafio da saúde ocupacional, pode-se dizer que em determinados cenários sobrepõe até as famigeradas receitas de uma alimentação saudável. Todavia, esse recorte do comportamento social é a reverberação da mudança do processo de comunicação. As plataformas de produção e consumo de conteúdo, com suas multiplicidades de funções, acessibilidade e formatos, interferiu na postura moral e corporal dos indivíduos. Mudou a postura do corpo e a postura dos indivíduos na sociedade, uma vez que foram empoderados no processo de comunicação, podem postar, compartilhar e até mesmo interferir em pautas e respectivos desdobramentos. A responsabilidade social já não é apenas um jargão corporativo, mas a premissa para interagir socialmente  seja como indivíduo ou como representante de um grupo ou empresa. Aqui não se limita a concepção de responsabilidade social a ações de filantropia, mas de desenvolvimento integrado justo, e responsabilização pelos respectivos atos em sociedade.

Nova Ordem Mundial. Aplicativos a mil. Mensagens trocadas, arquivos que vazam de propósito, ou por incidentes, acordos firmados, registros apagados, rastros polemizados no judiciário, manifestações de bites, amores por código binário, traições por caracteres, transformação social digital, baterias viciadas, pessoas libertas de paradigmas, a rede que se renova e expande imitando o movimento do universo, com colisões, explosões e novos mundos; a beleza orgânica da vida na matriz do tempo.
Roger Bolton (referência em Relações Públicas do setor industrial nos Estados Unidos) disse que a contemporaneidade nos encurralou em uma máxima conhecida desde os tempos de academia: Temos que melhores naquilo que já éramos bons. A geração millennials alastra-se na contemporaneidade (jovens, empreendedores, irreverentes, desvinculados a padrões tradicionais, mas comprometidos com problemas de ordem global, com a efetiva sustentabilidade, de produtos e processos, inclusive de relacionamentos interpessoal e institucional.

Neste sentido, é preciso agir de forma simultânea às mudanças. Fazer a leitura da paisagem, considerar seus recortes e a interdependência e desdobramentos de tais recortes. É compreender como as pessoas se comportam nas Redes Sociais Digitais, nas Redes Sociais Orgânicas (Grupos sociais - escola, religião, lazer, cultura, esporte), a maneira que produzem e consomem mensagens, observar como concebem e percebem os espaços que ocupam, os produtos e etc. Simultaneamente, deve-se entender o respectivo lugar (do comunicador) e função na paisagem e ser volúvel (sem ser leviano)no ambiente, lançando mão de atitudes de vanguarda para interferir e também do mimetismo para aceitação e reconhecimento.

Além de estabelecer um novo modus operandi na comunicação, as novas mídias (se utilizadas de forma equilibrada) expandem as fronteiras da evolução humana e flexibilizam distâncias físicas e intelectuais para estabelecer aquilo que entendemos como um mundo melhor agora.

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Publicado também na minha página em: http://obviousmag.org/rumos/

quarta-feira, 22 de junho de 2016

caminhos e percalços


Os raios de sol iluminam o rosto em uma manhã fria. O chão recebe passos que instintivamente caminham até a K-pax peculiarmente particular de cada um. Lugar onde pode-se entregar ao aconchego de se resguardar e até mesmo enfrentar as próprias aflições sem interferir no ambiente ao redor, fora de si. Entretanto a interação é inevitável, pois quando um corpo ocupa um espaço, ele o altera, mesmo que sutilmente.

Sensações delineiam as expectativas desde o início do dia. A liberdade de puxar o ar fresco da manhã o faz sentir vivo como um pássaro. O voar não lhe é um fardo, tampouco o gorjear sua sina e o semear uma prisão. As asas que perpassam o vento, dedilham no ar os sonhos mais tênues de um tempo que ainda não foi registrado. Ele beija a flor que o encanta.

Na construção da respectiva trajetória, perpassamos os fluxos dos outros, interferindo mesmo quando passamos por despercebidos. Andarilhos de interligações de um labirinto de fim desconhecido, nos movimentamos. Idas e voltas, transgressões de paredes, descoberta de novos corredores e sempre a mesma ideia de destino. Observando os caminhantes, percebemos o quanto somos, iguais, semelhantes, diferentes, únicos. Seja em um ponto de ônibus, na rua, ou escritório. Todos juntos em um espaço, todavia separados por infinitos. A mente em espaço e tempo diferentes, cada uma com a trilha sonora que lhe apraz. A interação de silêncios e de olhares vagos enquanto aguardam um certo agora, a próxima deixa.

Os fones de ouvido podem até agredir o tímpano e os cílios da cóclea, mas eles também nos protegem.  Nos exime de interações indesejadas no cotidiano, nos protege enquanto sonhamos acordados com sonhos difíceis, mas não impossíveis (depende do tempo e do passo), nos abstém de ouvir argumentos que ferem ou que provocam repulsa; permitem trilha sonora instantânea nos simples momentos do dia a dia. De certa forma, são instrumentos de paz e de guerra, prisão e liberdade.

Vermelha*, esta noite a lua sangrou meus lamentos, minhas palavras silenciadas, meu choro estancado; e desdenhou do amor pujante de meu coração, latente em minha alma. Brilhante, ela iluminou o orvalho com a esperança de inquietude e caminhos diferentes.

 *Lua de Morango, a cheia de Junho.
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terça-feira, 21 de junho de 2016

esses tais mapas


 
 
Época do Aniversário da morte de C. Jung. Renovam-se discussões, argumentos e conflitos sobre arranjos da psiquê; a desafiadora cartografia mental. Todos têm a facilidade de tentar interpretar e inferir no mapa à sua frente, mas fracassam na observância e manejo do próprio mapa. Há quem mistifique as relações entre realidade, percepção e ação/manifestação, há quem tente tornar raso e não razoável o entendimento sobre as nuances da identidade humana. O tormento da Fé, quando a razão não cabe no momento, dominado pela rima, conduzido pelo que se sente. A razão que não cabe no movimento.

Assustador, o contemporâneo seduz com agilidade e superficialidade a nossa aptidão por preguiça em perceber e conceber as diversas relações e respectivos desdobramentos da realidade. Uma realidade que se apresenta em hiperlinks, em rede. A rede nos aprisiona ao revelar nossos limites de transitoriedade e assimilação do todo a partir das partes e suas conexões com a rede (realidade). Lemos apenas o rótulo dos produtos socioculturais, diante do esforço em coexistir e compreender, nos entregamos a automatismos que alimentam os fluxos sociais.

Neste ínterim, a busca por consolidação de pilares como referência de interpretação da realidade e do que se passa em termos de significado e significante na mente do indivíduo é algo que atravanca a reflexão, uma vez que as pessoas se atêm às fontes e não ao conteúdo. Estacionam a argumentação e os conflitos em determinar as fontes oficiais (Carl ou Sigmund? Dentre outros embates), os argumentos da verdade, e assim gastam energia em aspectos periféricos, enquanto o epicentro da identidade humana e reverberações subsequentes não recebem a mesma atenção.
Assim, acredito ser interessante ir além do eco à beira do abismo e da imagem no espelho. As interfaces de nossa identidade devem ser vivenciadas e questionadas considerando os parâmetros do tempo, da significação coletiva, da absorção individual, da constituição do sistema de relevância de cada um e suas diversas interações no sistema social. "Navegar é preciso. Viver não é preciso [...] Viver não é necessário; o que é necessário é criar.", Fernando Pessoa.

sábado, 28 de novembro de 2015

Esse olhar


 

 

O rito da legitimidade das mensagens sofre pressão da diversidade dos meios e plataformas de comunicação. Os trâmites essenciais do processo de construção e disseminação de mensagens exigem agora não apenas habilidade para atuar em multimeios em tempo hábil (imediato), mas fundamentalmente em desacelerar um pouco a avalanche comunicacional e trabalhar a percepção sobre o que se quer dizer, a mensagem construída, as partes envolvidas, os repertórios destas partes (para tentar compreender a dinâmica de percepção), os desdobramentos de interpretação da mensagem e relacionamento com o processo de comunicação; tudo isso de forma perene e integrada à questão do tempo na contemporaneidade.

“A comunicação é a vítima desse progresso e é preciso desacelerar e realizar autorreflexão sobre ela”, com sabedoria se posiciona Dominique Wolton em entrevista à Comunicação Empresarial (Ed 95 - ABERJE 2015). Dentre os aspectos pertinentes a essa autorreflexão, na busca pela famigerada legitimidade, estão a linguagem, a percepção, o ritmo e os limites.

Após definir a mensagem e o público, é necessário refletir sobre a linguagem a ser estabelecida na narrativa, seu formato, plataforma e peculiaridades. Atentar ao ritmo de transmissão de mensagem e os limites de desdobramento (esses praticamente inexistentes). A partir disso, deve-se observar e até mesmo (resguardando a distância de observação do outro de Clifford Gertz) interagir com a percepção do outro para assim aperfeiçoar o processo de comunicação, redefinindo os ritmos da narrativa (incluindo a linguagem), limites de reverberação do conteúdo e a legitimidade de suas interpretações (atrelando vínculo com a fonte oficial do conteúdo).

O tempo inevitavelmente passa e isso não deve ser angustiante, mas argumento e espaço ideal para transformações e aperfeiçoamento, não em busca de perfeição, mas da perenidade do processo de comunicação, possibilitando inquietude, questionamento, diálogo, consenso e a liberdade de pensar e conviver. Neste sentido, o passar do tempo incita-nos a trabalhar esse olhar; esse olhar a realidade, olhar os sentimentos, espaços, pessoas e sentidos e assim narrar (em gestos e palavras) nossa experiência enquanto organismo vivo em interação social.

 


Esse seu olhar trincado, esse órgão fustigado pelo que pensa ser realidade. Suas palavras cheias de significados e escassas de sentidos tornam todo jardim um labirinto, onde os pés se ocupam com espinhos e a mente se liberta com os pássaros.







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terça-feira, 27 de outubro de 2015

espaços sentidos



A intensidade dos fluxos contemporâneos evoca reflexão. Metal, plástico, palavras e concreto armado sobre cabeças, sob pés. Recursos humanos e naturais na luta por um futuro aprazível. Cidades atrofiadas, campos mal utilizados. A sociedade tropeça em sua essência na busca por uma sustentável leveza de ser.

Pensar o querer geral e ser racional de Immanuel Kant e também perceber a relação dos seres com os espaços a partir do interesse e suas vertentes diversas. Os indivíduos com objetivos específicos, interesses pessoais se tornam seres sociais. Os seres sociais buscam estabelecer um ordenamento embasado no interesse coletivo. Todavia, o interesse coletivo é por muitas vezes uma roupagem aceitável do Interesse Dominante. Ou seja, um indivíduo articula seu interesse pessoal de forma a viabilizá-lo como o interesse de um ser social com potencial de se transformar em interesse coletivo. Por persuasão, submissão ou identificação para alcançar fins pessoais, outros seres sociais tornam-se adeptos do interesse proposto tornando-o Coletivo. Quando analisado em profundidade, este interesse nada mais é do que o interesse dominante não de um grupo, mas de um ser com poder articulador às vezes imperceptível em sua ação, mas evidente em suas consequências.

O significado de um espaço vai além de sua finalidade. O que um espaço representa para o grupo social e para um indivíduo diz menos sobre a estrutura e mais sobre quem com ele se relaciona. Inspiramos e expiramos sentimentos e sentidos, atribuindo significado às pessoas e espaços com os quais nos relacionamos com o passar do tempo. Neste sentido, quando passamos novamente por um local, é como se passássemos os olhos em um hipertexto construído essencialmente com partes de nós. Os links (de nossas experiências, mecânicas, orgânicas, superficiais ou não com aquele lugar) despertam novos olhares ou antigas sensações. Para isso, o tempo é quem determina o grau de envolvimento no momento da releitura dos espaços. Tempo de exposição, tempo de disponibilidade, tempo da lembrança e da memória. E a maneira como acessamos esses links interfere na dinâmica constituição do nosso caráter e na determinação das escolhas do presente.

A partir deste olhar, podemos conceber os espaços também como organismos vivos, erguidos e sustentados na multiplicidade de ser. A relação com ele vai além da simplicidade de definir se é público ou privado. Na dimensão de nosso relacionamento com ele, ora concebemos o espaço como privado (nossas percepções, sentidos, interesses e significados) e como público (finalidade operacional, interesse coletivo ou estrutural do local). Um local carrega em si apenas sua matéria estrutural ou também guarda os significados que os indivíduos a ele atribuem? Os significados estão em nós e são disseminados pela linguagem que utilizamos para representar os espaços? Refletir sobre esses aspectos pode contribuir para uma madura percepção dos indivíduos quanto à organização social, bem como a construção, uso e ocupação dos espaços. Trata-se de um vislumbre de um horizonte onde existam comportamentos além de La Belle Verte (filme de Coline Serreau - 1996). Talvez dessa forma, a famigerada sustentabilidade possa deixar de ser discurso e se consolidar como um retrato da vanguarda. Esta última materializada a partir de um novo olhar sobre organização espacial e suas possibilidades diante da demanda humana por subsistir e evoluir.

Publicado também na minha página em:
© obvious: http://obviousmag.org/rumos/2015/10/espacos-sentidos.html#ixzz3pn4Xey00

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terça-feira, 1 de setembro de 2015

pontuação;


Quanto mais meios, mais fins. Argumentos, desabafos e narrativas do porvir. Entre imagens que gritam e textos que silenciam: a vanguarda é o insistente "nunca será" que ecoa entre nós.

Assimilação é o diferencial de mercado. Todos produzem todos consomem. Quantos assimilam? Narrativas pulsam onde quer que o cidadão se volte. Sob este aspecto, tudo nos é novo e acessível, mas não necessariamente necessário. Ao se perder em acessar tudo quanto se pode, o cidadão fica na superfície de tudo, ao invés de mergulhar em algo que faça para ele alguma diferença, nem que seja nele mesmo.

O indivíduo que conseguir selecionar e organizar (cada um com seu senso e método)as narrativas que consome e produz, e posteriormente assimila o que é, a partir do que consome, interage e cria, então ocupará (às vezes sem perceber) um lugar especial na organização social, pois seu potencial de interferência no grupo social será mais apurado, uma etapa à frente do automatismo reinante.  Além disso, ele terá uma percepção mais intensa sobre suas experiências e sobre as perspectivas da vida.

A ruptura de tudo aquilo que se esconde corrói nossa alma de forma a contaminar a paisagem com nosso olhar. Isso é o que se propõe mas, inalterado, o ambiente é sutilmente acrescido de sentidos que passam desapercebido. Reféns; de nossos semelhantes, de nossas escolhas e pensamentos. Ninguém há de libertar ninguém. A hipocrisia impera até mesmo na face daqueles altruístas afogados em compaixão. Bandeiraram o Cristo ao invés de vivê-lo. Fazem com uma mão e divulgam com todo o corpo. Pintam arco-íris de ideologias, professam uma tradicional família e massacram valores básicos ao pé do ouvido.

Rompeu o solo a raiz que me sangra. As palavras saem nuas, sem sentido algum alfaiatado. Com suas formas espontâneas e inocentes, suas arestas e seu suor. Já não caibo mais nos clichês que tanto me alimentaram. Narrativas me encantam pela manhã e me conduzem para cama a noite. Quando a amargura entorpece ao coração, cabe à língua dar ou não vazão. E quando o refrigério vem, como um momento de gravidade, você hesita em sobrepor mãos; pois os lábios ressecam, tosse, a pupila dilata naquele quarto escuro; e a tela que brilha fustiga o tempo lá fora. A liberdade que expande e que nos aprisiona, tudo é tão simples e intenso.

Eu não voltei a escrever, pois não consigo respirar. Nunca parei de inspirar e pirar expiração enquanto não conseguem ler. Todos enxergam as frases, sem perceber o que o texto é. Gentileza é poesia, muito mais que verso. E a fé, a fortaleza que nos faz perceber o brilho e o sabor da vida que nos rodeia, que nos entrega e integra. Cansado, com uma paz que não cabe, com os dias que a guiar não veio. Ah, guiar não veio. Nunca virá.

A dimensão do não ser. Tudo está nas nuvens, a internet é o Big Brother (de Arthur Blair) e a grande biblioteca (o backup de nossa arrogância), mas quando chove não encontro mais a gota que eu evaporei. Doce tempo, amargas minhas lembranças de um futuro tão terno. Não há esboço para você e pra mim. Simples assim. Qual é o nosso traço? O que podemos assimilar?

O animal que sou nesse zoológico de trocadilhos. O termo que sou no texto que não escrevo. O tropeço e a pedra no clichê do poeta, no traço no muro, na rima no silêncio.

Tenho sede de paisagens. Tenho sede das suas paisagens, completou o menino que permanece calado.
E o quanto se assimila pode ser o que distancia a mensagem do meio; o significado do indivíduo.
A vírgula me para, o tempo me volta...

Veja também: http://obviousmag.org/rumos/

terça-feira, 7 de abril de 2015

Redes Orkutizadas - o Espelho de nossa vanguarda


Imagem: Ben Hopper


A contínua renovação das plataformas de comunicação não significa evolução humana e dos processos de produção de conteúdo, interpretação e desdobramentos possíveis.  A tão proclamada vanguarda sucumbe não ao ineditismo e novos padrões de percepção, mas à consolidação de paradigmas. Na verdade, submetidas ao tempo de uso, as plataformas refletem a estagnação dos usuários em expandir fronteiras do processo de comunicação. Reforçam aspectos sociais e funcionam como uma lente de aumento nas atitudes dos indivíduos.

Um automatismo é percebido no perfil de comportamento dos usuários. A manifestação pública é padronizada nas mídias sociais, independente se elas (mídias) são específicas para assuntos profissionais, pessoais, textos, fotos, e etc. O padrão de comportamento que tornou cansativo e obsoleto o Orkut, tem sido verificado não apenas no facebook, mas também no Linkedin e até mesmo no twitter e fóruns temáticos. A infantilização de postagens, a agressividade da linguagem de mensagens ideológicas, ou a avalanche de pílulas de auto-estima. Verifica-se mais um processo de busca por audiência do que por aprimorar relacionamentos via plataformas digitais.

O respeito é o mito na interação nas redes sociais digitais. A frequente imposição de versões dá o tom de um diálogo que mais parece um monólogo diante do abismo do que uma roda virtual de conversa. Este processo, tão repudiado pelos usuários, é o que os representa. Após orkutizarem o bate papo da praça, a interação no o ICQ, no MSN, no Face, a maioria segue com a massa para o próximo hospedeiro, tornando obsoleta a plataforma antiga. Neste ínterim, o Google Plus ainda é um território não contaminado pelo automatismo social, e, portanto, tem possibilitado mais leveza e fluência à interação com temas específicos; por enquanto.

Cada vez mais, acredito que a vanguarda do fazer comunicação está em revisitar os primórdios, resgatar a essência da comunicação no ato de conceber sentido, significado, mensagem e interação; ao invés de se entregar às possibilidades superficiais das novas tecnologias e novas redes. É preciso um mergulho profundo, potencializar as plataformas e possibilitar mais respiro do que sufoco ao ser humano, suas tradições, valores, ideologias e sonhos. Talvez esta seja a pauta em constante renovação, capaz de mudar o reflexo que temos apresentado.
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Avante
despertado o sentimento flui 
angustiado o tempo perde o compasso
o corpo se contorce
nus unimos

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terça-feira, 17 de março de 2015

Disseminar e verificar





A verdade que nos aflige não cabe na narrativa de um fato. As minúcias de uma apuração, que podem determinar o rumo das interpretações subsequentes, não estão evidentes nas curtas linhas. Menos ainda nas fotos e respectivas legendas. Quando os textos trazem declarações de autoridades então, o pandemônio dos dados é assustador. Seja em cenários de crises ou durante eleições, as declarações das fontes oficiais nem sempre contribuem para o indivíduo estar informado, mas de modo recorrente atrofia a percepção pública com elementos confusos, interferindo na narrativa.

Iniciativas como a do da organização argentina "Chequeado" (Site que verifica a legitimidade dos discursos de autoridades), estabelecem-se como mais uma estratégica para não absorvermos "opiniões" traduzidas em informações pseudo-isentas. Em essência, o serviço prestado por eles é o modus operandi que todo leitor deveria ter (principalmente e não somente, durante eleições e posicionamentos oficiais): cruzar informações do discurso com matérias já divulgadas e com dados disponíveis nos canais de transparência. Cabe ao leitor, antes de confiar, buscar resquícios dos fatos e confrontar versões. Sempre. Embora seja um processo cansativo (considerando o ritmo de vida), é ainda o menos ineficiente.

Nesse percurso, o leitor perceberá como muitos conteúdos são replicados em diversos veículos de comunicação. A ocorrência é tanto fruto do compartilhamento (autorizado ou não) de conteúdo, quanto o resultado de uma assessoria de imprensa com interferência em massa. Sobre o compartilhamento de conteúdo, interessante o que aconteceu com jornais de seis países da Europa. Fizeram parceria para promover a troca de conteúdo e pesquisas em comum entre eles na denominada Aliança Europeia de Jornais Líderes (Leading European Newspaper Alliance). Acredito ser uma estratégia interessante para otimizar recursos (reduzir custos de produção), mas sua operacionalização não pode engessar a narrativa em apenas uma direção. Funcionaria no Brasil tanto com veículos pequenos quanto com os grandes? De forma quase que underground alguns repórteres compartilham pautas, ou premissas de pautas e fontes, em um processo mais de negociação de informações do que de enriquecimento de narrativa e redução de custo de produção.

No universo paralelo, o Governo Federal insiste e nos bastidores tenta afinar o argumento para estabelecer regras para o funcionamento da mídia; a famigerada regulamentação da imprensa. Antes de implantar uma ação de controle para promover a responsabilidade narrativa aos veículos e interferir no que ainda há de liberdade, é importante consolidar os dados emitidos em declarações oficiais e o objetivo específico das respectivas atitudes. Não apenas disseminar informações e controlar o processo de produção, mas essencialmente possibilitar rastreabilidade aos dados, para que qualquer um possa verificar a legitimidade da informação de discursos de fontes oficiais e a narrativa construída pela Imprensa.
e o que não cabe no fio do olhar
como te fazer sentir?
como saber o que você sente?


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sexta-feira, 13 de fevereiro de 2015

Daltonismo velado

Ramon Bruin
foto:Ramon Bruin
Muitos estranharam o rebuliço dos últimos tons exibidos nos cinemas, sob a direção de Sam Taylor-Johnson e impressos nas intrigantes páginas de E. L. James (50 tons de Cinza). Filas, risadas contidas de um pudor e excitação social que até remetia a outras eras. A sociedade como uma nova Babilônia sem os jardins suspensos. Entretanto, nos é tão natural o que nos impressiona. Indivíduos reprimidos, assumem costumeiramente seu papel de ser social, defendendo uma posição conservadora, neutra, ou pseudo-liberal. Antes de pensar sobre como a narrativa trabalha o mundo das possibilidades e sobreposição de paradigmas é importante atentar para alguns aspectos em cena:

Homem novo, esteticamente aceitável pelos padrões de beleza, bem sucedido financeiramente e intelectualmente. Solteiro, com firmeza de atitudes e escolhas, até mesmo quando precisa ser sutil. Com certo mistério sobre sua vida pessoal e um toque de trauma psicológico que o torna suscetível a mudança. Com sabedoria no que diz respeito ao corpo e suas reações. Pilota, dirige, toca, manda, bate, fode e assopra. Do outro lado, ela: Jovem, bonita, frágil, bem humorada, inocente, porém determinada. Solteira, independente, culta, virgem, disposta a descobertas. Fiel, acredita em relações sentimentais duradouras, baseadas em cumplicidade e transparência. Capaz de assumir o controle em discussões, domando o outro por meio do desejo e da mente.

Esses aspectos de certa forma manifestam o tão sonhado imaginário dos gêneros. Representa as projeções psíquicas que os indivíduos fazem na busca pelo parceiro ideal. Nem tanto sacro, nem exageradamente profano. Algo que supra a demanda pelo equilíbrio entre dominar e ser dominado. Produzir um gesto que tenha intensidade, força e ainda sim sutileza. A partir desses elementos, a narrativa perpassa por linguagens que atingem o imaginário coletivo, e simultaneamente afagam as projeções íntimas de cada espectador, que em silêncio reage e cautelosamente esboça (ou constrói) sua interpretação para a sociedade em que vive.

Um corpo contido nas poltronas, o princípio de furor entre as pernas. Uma história é exibida na tela, com fotografia e trilha sonora fantásticas. Ritmada por cortes concatenados com suspiros, mover de pálpebras e até mesmo o molhar os lábios. Outras histórias são compostas ou remexidas no cérebro de cada um. A liberdade do silêncio, no escuro de uma sala de cinema.

O que se perde com o piscar dos olhos? As sensações que ainda não traduzimos em imagem, tampouco em palavras. O que há além dos créditos finais? O volúvel ser humano e suas possibilidades de relacionamento.

O relacionamento humano a todo o tempo rompe paradigmas com a instituição de novos paradigmas. O elemento paradoxal deste fato nos faz perceber que um significativo aspecto que caracteriza uma sociedade é a maneira como o coletivo concebe conceitos, manifesta e reproduz interpretações a respeito de sentimentos. As ambições individuais e coletivas nutrem sentimentos que orquestram os gestos. A sobreposição dos gestos e sua aceitação pelo grupo consolidam tradições e paradigmas, sobre tudo: religião, política, sexo, espiritualidade e etc. Neste sentido, transcender não é extinguir, mas expandir as fronteiras da percepção e do comportamento. Trata-se de romper um paradigma com outro, sem a preocupação, ou a consciência, de que pode se repetir neste movimento quase de dança. E o sexo também pode ser visto sob o viés desta dança.

Se todas as possibilidades na ordem e relação das forças já não estivessem esgotadas, não teria passado ainda nenhuma infinidade. Justamente porque isto tem de ser, não há mais nenhuma possibilidade nova e é necessário que tudo já tenha estado aí, inúmeras vezes. (Friedrich Wilhelm Nietzsche).

O sexo em película vai além do que se pode projetar em um quarto escuro, mas reverbera no obscuro da constituição do “ID” do indivíduo simultaneamente à sua constituição como ser social. O teatro não conseguiu explicitar em cena todo a pandemônio da Casa dos Budas Ditosos (livro de João Ubaldo Ribeiro sobre a Luxúria, em 1999), As duas partes da Ninfomaníaca (lançado em 2013) do dinamarquês L. V Trier chegaram perto do quão cru é a realidade, o desejo, vontade e representação; o quão belo e trágico é coexistir. Contudo, o ápice das obras não está no clímax apresentado na tela, mas no efeito em quem assiste, em como a absorção daquele conteúdo consolida ou refaz conceitos, interfere na constituição do indivíduo, sendo o prelúdio de suas próximas escolhas. A vanguarda pulsante que autores buscam vai além do produto de sua arte; mas depende do efeito no outro e da continuidade da interação com a mensagem da obra cinematográfica.

Neste ínterim, percebe-se que o pano de fundo da reflexão sobre o sexo no cinema é a construção de valores e sua atribuição aos paradigmas vigentes ou aos que virão por ser estabelecidos como item de uma nova ordem social mundial. Esse processo acaba por definir também o que é polêmico. Quando temas polêmicos são abordados na tela do cinema, nas páginas de livros ou conversas ao ermo, não se trata de um gesto impensado, mas construção de mensagens que se propõem como pílulas de reflexão. Se placebo ou cura para um mal social, apenas sua absorção ao longo do tempo indicará uma resposta; todavia não esgotará o assunto, pois ele se renova.


Afora o que se concebe em palavras, há de se desdobrar o diálogo, buscar compreender e vivenciar os efeitos de mensagens da sétima arte, vendo-as e sendo-as como uma obra de Dali... ou como as migalhas da Casa de Budas Ditosos e a intensidade melancólica de L.Von Trier.

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sexta-feira, 2 de janeiro de 2015

Alcachofra


A construção das mensagens e das narrativas possuem uma essência que não consegue ser representada pelos códigos linguisticos. Desta forma, faz com que o processo seja contínuo, em uma frenética busca por registrar e manifestar a plenitude do que pensa, sente e percebe o indivíduo. Neste ínterim,  o indivíduo travestido de ser social acumula experiências e interferências na essência primária, fato que expande o que se quer representar e alimenta o ciclo de criação das mensagens e narrativas.

"Quanta suavidade cabe nesse corpo? Quanta tristeza preenche o colo, os olhos, o copo? Como esconder, como sobreviver... A realidade despetalada diante dos sonhos.... O coração da alcachofra servido nas gotas da chuva. O inconfundível aroma de canela me abraça, me aquece.


Perco-me entre tantos testes e oscilações das emoções. Já não reconheço minha escrita, pois ela exala meus sentimentos, ultrapassa meus pensamentos...

Os efeitos da Cantárida são produzidos naturalmente e saem pelos meus poros. Essa canção sem dança orquestrada, esse suspiro sem sangue, o torpor  sem droga. O envelhecer de mãos dadas no amadurecido silêncio, como uma certa esperança.

E eu quis a canção que alcançava minhas emoções, meu passado no presente meu futuro no tempo. E além dele. Mas apenas letras em frases, suspiros e soluços sem melodia... Eu nu no silêncio, na madrugada.


olhos meus fixados;
Inquieto coração;
e a distância faz dela um verbo.
Ela me lua!
Eu suo a frase sem paradeiro..."