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domingo, 18 de junho de 2017

poça passo peço



A iminência de um passo. A gota formada desce pelo ar sem mira, sem esperança alguma, sem qualquer pensamento sobre passado presente e futuro. Sem preocupar-se com o estado em que se encontra, sem ao menos ter ciência de sua pureza. Cai, repousa na face de quem o céu observa na esperança de ser refrigerado, corpo e alma. Durante uma caminhada o automatismo mantém em movimento o corpo enquanto a mente se liberta para buscar soluções, rumos, tempo. “A falta de alternativas clarifica maravilhosamente a mente.(Henry Kissinger)". Uma mente clarificada, sem as névoas do dia a dia, permite perceber a vida, o ambiente ao derredor, de uma forma diferente. Entre as formas de tocar, a mais intensa é o olhar. Suas camadas, suas cores e seus versos. Não melhor ou pior, mas diferente. Seu doce vai além da formiga que chama ao vento.

Assim o tempo se embrenha no vento e dobra sobre os poros, escorre pelo olhar, mantém-se tempo, vento. O ruminar memórias de estrangeiros, os passos de Marco Polo revelando invisíveis curvas que dobram conceitos. O segredo das pisadas não está na direção. Se te escrevo me descrevo, me embrenho e ainda respiro.

Esse laço desfeito sobre nossas cabeças que solta-nos ao ar em uma queda onde a liberdade é o tormento de distanciar-se do que se deseja. Você não compreende o que é fazer da palavra um punho fechado a esmagar o coração no peito, comprimindo suas batidas, espremendo o que corre nas veias.
...

Plenamente belo, o beija-flor perpassa os fios do vento carregando em si o pólem da esperança, o sabor do verso de amor. Antes de pousar, o beijo, o momento delicado de reverter a física a favor de um instante. Meu olhar encontrou repouso no seu voo. Os ambientes passavam e entravam dentro de mim.

domingo, 4 de junho de 2017

Tensão Superficial


A Política Externa e suas interfaces

A partir da leitura da realizada pela abordagem de Zygmunt Bauman, onde a modernidade revela uma sociedade líquida, podemos expandir o olhar e refletir acerca da percepção dos movimentos da organização social. A liquidez da sociedade, seus conceitos e suas relações, atribuem ao indivíduo uma nova vertente de comportamento e de busca para alcançar um estado de harmonia. A perenidade já não é mais um estado viável, pois segundo Bauman, "Nada foi feito para durar", tudo então é transição. A referida transição, segundo a liquidez de Bauman se ampara no desejo individual extrapolado para o coletivo. Um bom vinho e as armas adequadas para degustar a líquida sociedade.

Diante de um mundo líquido, onde cada um é potencial produtor e reverberador de conteúdo, é preciso ter muita maturidade ao se falar de política e não apenas ter o vigor da paixão. O ser humano, animal político e social, não pode confundir esta vocação de sociabilização (por meio da política) com paixão, desejo íntimo de saciar-se. As intermitências da ética materializam os lapsos humanos em defender os interesses íntimos travestidos de bem comum e bem-estar social. A história das nações e seus ciclos de poder revelam como cada vez mais a sociedade sofre com os abalos da moral humana.

O “derretimento dos sólidos”, traço permanente da modernidade, adquiriu, portanto, um novo sentido, e, mais que tudo, foi redirecionado a um novo alvo, e um dos principais efeitos desse redirecionamento foi a dissolução das forças que poderiam ter mantido a questão da ordem e do sistema na agenda política. Os sólidos que estão para ser lançados no cadinho e os que estão derretendo neste momento, o momento da modernidade fluida, são os elos que entrelaçam as escolhas individuais em projetos e ações coletivas – os padrões de comunicação e coordenação entre as políticas de vida conduzidas individualmente, de um lado, e as ações políticas de coletividades humanas, de outro (BAUMAN, 2001, p. 12).

Na leitura da sociedade líquida, percebe-se um ponto de tensão determinante para a organização social. As relações Internacionais e devidos desdobramentos. A política externa transita pela tensão superficial da sociedade.

A Tensão Superficial é o fenômeno físico pelo qual passa todos os líquidos. Este fenômeno consiste na formação de uma espécie de membrana elástica em suas extremidades. Trata-se da tendência de todas as moléculas do líquido a se compactarem em direção ao centro de massa, pois existe sempre uma resultante em todas as moléculas que aponta para o centro, de forma que criem a superfície externa de menor área possível, uma vez que todo sistema mecânico tende a adotar o estado de menor energia potencial.

"A tensão superficial da água é resultado das ligações de hidrogênio, que são forças intermoleculares causadas pela atração dos hidrogênios de determinadas moléculas de água (que são os polos positivos (H+)) com os oxigênios das moléculas vizinhas (que são os polos negativos (O-)). No entanto, a força de atração das moléculas na superfície da água é diferente da força que ocorre entre as moléculas abaixo da superfície. Isso ocorre porque essas últimas apresentam atração por outras moléculas de água em todas as direções: para cima, para baixo, para a esquerda, para a direita, para a frente e para trás. Isso significa que elas se atraem mutuamente com a mesma força." (FOGAÇA).

A política externa dinamizou-se para além das negociações de fronteiras e gestão de recursos naturais (fontes de energia e alimentação) para um jogo politizado, com viés de relacionamento democrático e igualitário, tendo midiatizada a política externa. Trata-se de uma caminhada sutil pela tensão superficial da realidade e fundamentos da sociedade. Desta feita, faz-se primordial refletir sobre o Estado e sua filosofia de relacionamento internacional.

A ordem mundial e a famigerada disputa de ideologia de Estados dominantes. As relações internacionais, para a constituição e manutenção de uma ordem mundial passam pelo diálogo e debate de anseios e posições de cada Estado dominante. Considerando aqui Estado Dominante, a nação detentora de poder de interferência no mercado mundial seja por controle de recursos naturais, materiais, bélicos ou humanos. Os exemplos perpassam as cadeiras da Organização das Nações Unidas (ONU) e hasteiam bandeiras pelo globo.

Importante considerar então, o modo como os sistemas alternam entre o idealismo, estabilidade hegemônica e o realismo. Sob o viés da teoria da estabilidade hegemônica, a estabilidade buscada em escala global está atrelada mediante os regimes e decisões arbitrárias. Uma potência ou Estado dominante assume uma posição de liderança mundial e determina as práticas e diretrizes aceitáveis para o relacionamento internacional. Entretanto, quanto maior o regime hegemônico, mais complexo os mecanismos de controle e garantia de cumprimento dos interesses soberanos. Desta feita, a potência, para obter estabilidade social, deve estar sempre no poder global, sendo reconhecida, por consenso (O consenso vem da divergência e processo de diálogo.) ou submissão, como regente da organização mundial, determinando limites e liberdades. O Estado então é concebido a partir do respectivo potencial de monopolizar a nação e o mercado de forma coercitiva. Para se manter, o Estado deve entender e formar blocos de aliança onde o poder é controlado, para assim não ser destituído por outro Estado dominante.

Evoluindo neste cenário, a teoria realista coloca o Estado como o epicentro das decisões. Neste contexto, partindo da concepção de que as relações internacionais são, por natureza, conflituosas, o Estado cerceia o conceito e prática de democracia no ambiente interno das respectivas nações, bem como o deturpa no cenário mundial. Instaura-se assim, a guerra como instrumento de se estabelecer a paz. Trata-se de uma medida dos Estados para maxização de poder e soberania ideológica. Assim, o processo conflituoso de sobreposição de poderes propicia o caos social. Princípios éticos no pensamento realista perdem espaço para a instintiva busca por sobrevivência (seja física ou ideológica), logo, conflitos são estabelecidos e atrocidades tidas como processo necessário. Trata-se de viver o mundo que se encontra e não o que se deseja.

Contudo, o idealismo propõe uma sociedade igualitária em poder de voz, onde a estabilidade seria construída pelo diálogo e não pelo confronto e agressões. O bem coletivo é o norte das decisões de forma a construir a ideia de uma moralidade internacional de cooperação. Nesse sentido, são defendidas as liberdades individuais e o Estado não tem poder arbitrário para agredir valores sociais e cometer abusos de poder. Os conceitos e relações sólidas de uma sociedade padronizada sofreram as interferências dos novos tempos, e sua operacionalização sucumbiu a uma perspectiva alternativa.

O “derretimento dos sólidos”, traço permanente da modernidade, adquiriu, portanto, um novo sentido, e, mais que tudo, foi redirecionado a um novo alvo, e um dos principais efeitos desse redirecionamento foi a dissolução das forças que poderiam ter mantido a questão da ordem e do sistema na agenda política. Os sólidos que estão para ser lançados no cadinho e os que estão derretendo neste momento, o momento da modernidade fluida, são os elos que entrelaçam as escolhas individuais em projetos e ações coletivas – os padrões de comunicação e coordenação entre as políticas de vida conduzidas individualmente, de um lado, e as ações políticas de coletividades humanas, de outro (BAUMAN, 2001, p. 12).

A descentralização dos polos com o fim da Guerra Fria instituiu no cenário mundial uma horda de nações emergentes e mercados instáveis em termos de produção, consumo e sustentabilidade.  A gestão de território tornou-se ainda mais complexa sem as bandeiras ideológicas regendo as relações internacionais. As grandes promessas econômicas (países emergentes) configuraram uma alternativa ao mundo organizado segundo os padrões do Estado Dominante Americano (EUA). Destaque especial para a China, que se tornou o principal parceiro comercial bilateral (maior importador desde 2009), como afirmou Jim O’Neill (Chefe de gerência acionária do grupo financeiro Goldman Sachs – que cunhou o termo BRICS - acrônimo referente Brasil, Rússia, Índia e China). Os BRICS detêm mais de 21% do PIB mundial, formando o grupo de países que mais crescem no planeta.

Durante os últimos vinte anos, a política externa virou um dos principais campos de batalha entre PT e PSDB, os dois polos que se elegeram pelo voto popular para a presidência da República. Poucas políticas públicas foram tão polarizadas e controversas. De um lado, os petistas enxergaram no governo Lula a diplomacia mais arrojada. Com sua política externa ativista, Lula teria elevado a posição do Brasil à de grande potência emergente. Segundo essa visão, FHC representaria o exato oposto: a capitulação de uma elite entreguista à hegemonia dos Estados Unidos. A cena que esse grupo gosta de reprisar é a do último chanceler tucano, Celso Lafer, tirando os sapatos para uma revista de segurança em aeroportos norte-americanos. Do outro lado do ringue, encontram-se os tucanos, para os quais o presidente-sociólogo teria normalizado as relações com o mundo, tirando o Brasil do isolamento acumulado nos anos de ditadura militar e de atraso econômico. Para eles, a diplomacia petista seria uma função da vaidade prepotente de Lula e sua equipe. Em ninho tucano, a cena em reprise é a de Lula em Teerã, punho no ar, desafiando as grandes potências num abraço com o presidente iraniano, Mahmoud Ahmadinejad. (FELLOW e SPEKTOR. 2016 P.18)

Neste novo cenário, nações formam missões (de iniciativa privada e poder público) para defender interesses de setores e vetores de desenvolvimento na busca por mercado e integração. As recorrentes missões do Governo Brasileiro em visita a países Asiáticos (Ex: Japão) reforçam esta observação.  Acordos de Cooperação e Protocolo de Intenções tornaram-se corriqueiro instrumento de formalização da política externa. No Brasil, assim se busca investimento estrangeiros e apoio político e tático nas relações comerciais (na medida em que decisão da AGU em 2010 sobre a LEI No 5.709, DE 7 DE OUTUBRO DE 1971, restringe a ocupação do capital estrangeiro no território tupiniquim na intenção de resguardar a soberania nacional; cerceando assim o investimento do capital estrangeiro).
O sistema político mundial está sofrendo os efeitos da perda de credibilidade e confiabilidade da opinião pública referente aos políticos. Assim, percebe-se uma horda de personagens da iniciativa privada, que até então atuavam no meio político como articuladores e financiadores, assumindo papéis políticos, para realizar gestão pública. Cidades, Estados e Países (EUA), elegem e creditam mudança a ícones da inciativa privada. Dentre os vários riscos envolvidos, está o de gerar conflitos de grandes proporções, em função de um choque de linguagens. Se a iniciativa privada, que conduz seu plano de negócios com base em decisões, estratégias e práticas Técnicas, tentar conduzir assuntos de natureza Política de forma técnica, irá potencializar tensões, não compreender as nuances da gestão política do território, e atrofiar relações necessárias para a manutenção da sociedade.

A Era Trump instaura no mundo, um cenário de instabilidade das projeções políticas e da democracia, amplificando riscos de conflitos internacionais e vulnerabilidade dos diversos mercados. Suas estratégias para alavancar a economia daquele país, com geração de emprego e fortalecimento econômico são controversas. Todavia, levantamentos da Economist Intelligence Unit - EIU sugere que na América Latina o Brasil será um dos menos afetados e corre menos riscos com as medidas norte-americanas de política internacional nesta nova era, fundamentada em um protecionismo de interferência no comércio internacional.

A política externa brasileira tem evoluído no sentido de flexibilizar parcerias de modo a potencializar setores econômicos nacionais no mercado mundial. O País buscou além de acordos de livre comércio, recuperar voz efetiva nas discussões globais sobre o clima, sobre os direitos humanos, liderança regional e a democracia. Todavia, as articulações fora do cenário econômico pouco avançam. Não há no país, resultados de uma integração internacional em respectivas políticas públicas no que concerne a melhoria de qualidade de vida da população, modelo de gestão política e organização social.

O Brasil vive um momento de emergência nacional. Em três anos, acumularam-se a crise política inaugurada com os protestos populares (2013), o início de uma longa recessão econômica (2014), a expansão da operação Lava Jato (2015), a queda de Dilma Rousseff e a implosão eleitoral do PT (2016). Depois do ciclo virtuoso de mais de uma década, a trajetória do Brasil é negativa. O pano de fundo dessa transformação para pior foi uma economia global de baixo crescimento, o aumento de nossa dependência econômica em relação à China e a onda global de neopopulismo, que venceu o voto pela saída da União Europeia no Reino Unido e levou Donald Trump à presidência dos Estados Unidos. Esse é o contexto no qual se impõe a necessidade de modernizar a doutrina brasileira de política externa. (FELLOW e SPEKTOR. 2016 P.18)

O Nacionalismo econômico defendido tanto no Brasil, quanto no modelo defendido por Trump desconsidera nuances de uma estabilidade social e democrática. Neste sentido é fundamental reestruturar as leituras e objetivos do cenário interno para melhor definir as diretrizes de relações internacionais. A inserção do país em discussões, com poder de interferência, em questões globais, passa por um fortalecimento dos objetivos que a nação tem além-fronteiras.

A construção de uma nova doutrina de política externa demandará algum tipo de consenso suprapartidário. Não é uma tarefa que possa ser descolada do processo político interno, nem uma empreitada viável no curto prazo. Ao contrário, trata-se de um esforço que demandará alguns anos de maturação, com ideias e conceitos que, um dia, possam compor um arcabouço doutrinário mais ou menos coerente. A ideia de uma doutrina de política externa é recorrente na história brasileira.  (FELLOW e SPEKTOR. 2016 P.22)

A política internacional de forma integrada prevê a valorização das nações emergentes, encerrando a velha dicotomia de mercado, sem isolar e criminalizar os Estados Dominantes tradicionais. É importante que as nações possam ser distinguidas individualmente e também em grupo. Não como um instrumento de manobra política em prol dos interesses de um eixo, mas como um player relevante, que transita com habilidade entre as especificidades da nação em si, e em grupo. Padrões de crescimento bem-sucedidos devem ser adotados e estimulados. O amadurecimento necessário para se posicionar no novo modo de fazer política que o caos presente evoca, apenas será alcançado se as legendas e fronteiras forem extrapoladas e expandidas. As nações, em espacial o Brasil, precisa conhecer e equilibrar seus potenciais internos e externos para ocupar um lugar de relevância na transição do uni para o multipolarismo das relações internacionais.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Bauman, Zygmunt. Modernidade Líquida. Ed. Zahar, 2001

Bauman, Zygmunt. Arte da vida. Rio de janeiro: Jorge Zahar Ed., 2009.

FELLOW, Senior. SPEKTOR, Matias. Coordenação: 10 Desafios da Política Externa Brasileira. 2016. CEBRI. Fundação Konrad Adenauer

FOGAÇA, Jennifer Rocha Vargas. "Tensão Superficial da Água"; Brasil Escola. Disponível em . Acesso em 18 de maio de 2017.

quinta-feira, 16 de março de 2017

Estado Poder e Bem-estar


Antes de olhar o Estado e suas configurações, olhar o indivíduo. Pensar o querer geral e ser racional (lembrando Immanuel Kant) e também perceber a relação dos seres com os espaços a partir do interesse e suas vertentes diversas. Os indivíduos com objetivos específicos, interesses pessoais se tornam seres sociais. Os seres sociais buscam estabelecer um ordenamento embasado no interesse coletivo. Todavia, o interesse coletivo é por muitas vezes uma roupagem aceitável do Interesse Dominante. Ou seja, um indivíduo articula seu interesse pessoal de forma a viabilizá-lo como o interesse de um ser social com potencial de se transformar em interesse coletivo. Por persuasão, submissão ou identificação para alcançar fins pessoais, outros seres sociais tornam-se adeptos do interesse proposto tornando-o Coletivo. Quando analisado em profundidade, este interesse nada mais é do que o interesse dominante não de um grupo, mas de um ser com poder articulador às vezes imperceptível em sua ação, mas evidente em suas consequências.

O aspecto moral dos modelos de socialização do poder e modelamento econômico deve ser considerado para redefinir a Ordem Social de forma a fortalecer o Estado Contemporâneo, conforme aborda Keynes, baseado em liberdade (livre mercado) com maior participação do Estado (moderador). Essa base liberal onde acesso e oferta são instrumentos de moderação do Estado merece atenção para compreender os desdobramentos na contemporaneidade. Keynes defendia processos abertos, passíveis de manutenção (ex: capitalismo) onde a liquidez é uma instância de consumo, entre o presente e futuro.

As demandas sociais pertinentes são então vistas como questões periféricas. Atributos como o Pleno Emprego se instala como elemento fundamental para o bem-estar social. Assim, os mecanismos de controle do planejamento político evocaram dos players maior conhecimento e domínio de mercado e finanças (Uma vez que o estado na era do Welfare não controlava efetivamente as práticas econômicas privadas, nem sob o aspecto de produção), e compreender modelo de negócio (produção / demanda / mercado / consumo). Neste cenário, com a premissa de exercer o referido controle e participação, o Estado busca promover melhor distribuição e organização dos recursos e promover melhorias na remuneração em busca do Bem-estar social. Lembra muito o projeto de Renda Mínima do ex-senador da república Eduardo Suplicy (Renda de Cidadania: A Saída É Pela Porta). Realidade ou utopia? Mecanismo de alienação ou acesso social a recursos?
Reformas sociais então transitam entre assistencialismo e distanciamento social sob um viés de redistribuição igualitário de recursos e riquezas, com nuances de concessão de poder, nem que seja de consumo.

As configurações do poder esbarram em aspectos recorrentes da organização social, em função de muitas vezes serem especificidades do ser humano. A estabilidade (via plano emprego) tornou-se, na contemporaneidade, o "ouro de tolo" da população, manejada agora por uma nova configuração política. Configuração na qual a esquerda, ou nova esquerda como se refere o autor (Deborah Farah) surge com um viés mais articulador do que extremista, fugindo de um capitalismo radical e de um socialismo burocrático por demasia. A demanda pujante por um novo Estado reflete o nascimento de uma nova sociedade, com outro poder de posicionamento de suas demandas e modo de exercer pressão. Há então uma demanda significativa por mais agilidade na dispersão e homogeneização social das narrativas de poder e controle; fato que pressionou mudança em plataformas e narrativas de comunicação e repasse de informações. A massa exerce pressão sobre o Estado em busca de respectivos direitos.

O Estado então, decisório da política, precisa de uma licença social. É necessário que a população (concordando ou não) aceite e valide o processo político para que a diretriz do estado seja executada e permaneça vigente. Os conflitos sociais que antes perpassavam o choque entre classes (Burguesia e Operariado) agora se instala em individualidades e seus valores (gênero, sexo, profissão, e etc.) e não em ideologias de massa. Portanto, entidades representativas, tais como Sindicatos, perdem poder de mobilização e interferência, fato que leva o Estado a formar redes de colaboração com a iniciativa privada, essa que se tornou parceira mais presente nas políticas públicas. A voz da sociedade, sua participação, é compreendida então pelo Estado como algo fundamental para a construção da democracia, porém arbitrariedade (exercida pelo Estado ou órgão regulador) é o que regula e viabiliza processos democráticos.

Como já disse em outro texto, a globalização estimulou a integração de padrões territoriais de modo a possibilitar o diálogo de “tribos”, de suas demandas, anseios e oportunidades de saciá-las além fronteiras; considerando demandas e anseios nos aspectos culturais, econômicos, intelectuais, de subsistência e desenvolvimento.

Neste ínterim, a arte e suas diversas concepções, tornou-se instrumento essencial de manutenção dos padrões sociais; tanto para reafirmar quanto para romper paradigmas e sobrepor dogmas. Desta forma, a noção de identidade de um ator social depende de suas singularidades enquanto indivíduo e de sua interação na paisagem social, perpassando pelas influências em “si” dos produtos culturais que consome, acessa ou até mesmo reproduz. Isto pode ser observado nas dinâmicas de apropriação e ocupação territorial e interações consequentes, definindo regras e limites, espaço público e privado. Portanto, percebe-se cada vez mais que identidades culturais volúveis e segmentadas tomam lugar de destaque social ante as identidades culturais tradicionais, fato que evoca mudança na maneira de transmitir a história a gerações futuras.


Outro viés da Globalização é a mudança do mercado e seu controle. Pois agora a demanda não dita as regras, mas os fluxos de sobrevivência e competitividade também interferem no processo, uma vez que geram fluxos que vão além de demandas existentes, criando outras "necessidades" que até então a sociedade não imaginava e o Estado nem concebe uma forma de gerir, moderar ou participar. Esse novo cenário propicia mudanças nas relações de trabalho e dispersão de produção e produtos, com certa flexibilização que reorganiza o consumo. A nova organização econômica passa então empodeirar o sujeito enquanto consumidor de inovações, gerador de novas demandas. Estabelece-se assim nova ruptura no modelamento estrutural do Estado, que vê suas premissas escorrerem junto à chuva da vanguarda.

Publicado também em minha página no Obvious - http://obviousmag.org/rumos/

sexta-feira, 10 de março de 2017

cortejo



O dia em que me mataram não foi um dia. Não foi o clichê de um livro autoajuda, com uma mensagem refrescante de um revigorar do empoderamento. O dia em que me mataram, com minha ajuda, foi mais um momento sublime no mundo. Belo.

Furtaram de meus lábios as belas palavras para fazerem florir os jardins que despetalaram; drenaram de meus poros o suor para seus templos, seus relatórios, gozos, suas alianças forjadas no egocentrismo. Sobrou-me as migalhas da confusão, os conceitos desprezíveis de uma frase, os adjetivos que não harmonizam ao paladar.

Castraram o olhar, dobrando o horizonte. Amarraram o sorriso na amargura de sempre quererem mais, e nunca alimentarem a fonte dos sorrisos. O amor... esse, eles torturaram de todas as maneiras que dispuseram. Permiti na esperança de que um dia acordassem, e refletissem e mudassem. Permiti na esperança. O credo que cravou minha história em minhas rugas, meu silêncio em minhas limitações. Não foi um roubo, não foi um crime, foi uma mais ação de sobrevivência daqueles que perpassam minha vida, assim como a de tantos. No ínterim dos últimos suspiros veio-me a indagação sobre quem ajudei a matar, quem matei, simultaneamente ao meu processo de morte. Somos interferências e não paralelas, somos intercessões inomináveis.

Esse cortejo é poema, é o cortejar a donzela de vidro trincado a ferir meus versos. A felicidade de um bom olhar, o sorriso prestativo, a intensidade de amar, de ouvir, de buscar e de ser.

O domínio da luz do sol sobre as plantas, o domínio de seu calor sobre mim. A chuva delineando meus poros, inundando minhas ideias e contendo meus passos. Não corro. Banho-me. A natureza me envolve como parte dela. No vento estou, nas migalhas da paisagem, no perfume que vem sem anúncio, sem paradeiro.

segue-se

domingo, 26 de fevereiro de 2017

és texto



Uma tristeza sem anúncios se instalou no instante; intensa, sorrateira. Sem movimento, ela interferiu no olhar. Assim, as cores apresentaram uma tonalidade que não conheci. E o perceber o tempo se tornou um exílio.

Carne, corpos e escolhas. Transeuntes de um hall que esconde vaidades, necessidades, desejos e aflições. Narrativas pontuadas pelo corpo que fala, pelos gestos, pelas roupas, pelos cheiros, e silêncios. Transeuntes são estandarte de um estilo, pintando a diversidade dos saguões. Observo. O sentimento é refém.

O cansaço e o aprender a descansar. Destroços e distrações.
Reluz então o esplendor pujante que me refaz escolhas.
és tu texto, impregno-me de ti
e ler é tornar-se cúmplice do porvir...

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segunda-feira, 13 de fevereiro de 2017

climáticas mudanças


Alternância conceitual, sensações dançam em um frenético ritmo, o do silêncio. A mudança. Felicidade. Busca. A inquietação alimenta estigmas da humanidade que pulsam na iminência de encontrar a peça que lhe falta no quebra-cabeça. Uns vivem ignorando este fato, e se atêm às praticidades da vida (seja por necessidade - princípio básico de foco na sobrevivência - ou por simples alienação pelo conforto de apenas fluir), outros enlouquecem a percebê-lo. E sempre há os que transitam pela cidade das sombras sabendo a verdade de Shell Beach, mas ainda querendo refrescar-se nela.

Calmas águas levam sentimentos para o mar. Terra, peixes, madeira e algumas estrofes despedaçadas. Ele não sabia que parte dele também ia naquele rio. Parte que ele nem sabia que dele um dia já foi.

Sorrisos trincados rompem o horizonte. A sala se enche de uma expectativa morta, de uma sensação estranha de esmagamento, a partir de dentro. Os olhos indicam um coração espremido. Prestes a transbordar, o olhar toma as rédeas dos pensamentos e alça voo.

Sutil como um raio rompe o céu. Algumas situações fazem estrago pela sutileza que carregam. O estrondo posterior apenas é lamúria fúnebre de uma emoção sepultada, de um agonizante sentimento que outrora pujante exalava beleza.

De todo o papel gasto, que palavras faltam? Quais sobram? O amor posto à prova, perpassa chuva, sol e desconstruções. Se morre, era mesmo ele amor? ou ensaio? se vivo, permanece o que há de ser? "O amor, quando nasce, só vê a vida, o amor que dura vê a eternidade". Victor Hugo in 'Carta a Juliette Drouet'

Climáticas, mudanças despontam no horizonte. Brilha.


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sexta-feira, 16 de dezembro de 2016

Individuus


 

 
A organização social contemporânea impele ao indivíduo um comportamento de egocentrismo. Para coexistir o ator social com esse perfil precisa de público e referência, para então impor suas singularidades, legitimando-as como objeto de consenso ou bem-estar social. Importante considerar a etimologia; do latim medieval individuus (indivisível), que é formado de in + dividuus. O vocábulo dividuus vem de dividere (dividir). O processo de formação de indivíduos compreende interferências da sociedade, ou seja, depende das relações sociais e culturais (variando o grau de intensidade), formando assim a identidade do ator social.

A construção da realidade social passa pelo interesse. Interesse constituído pelas vontades, necessidades individuais, e pelo consenso coletivo subsequente. O sujeito está cada vez mais centralizado como ator social individualizado, interferindo na Rede Social para apenas atender seus objetivos, isso até mesmo quando demonstra nuances de altruísmo. Este aspecto fica latente quando consideramos a leitura que Adorno faz do indivíduo em sociedade, enquanto sujeito, onde por mais que submete-se a fluxos impostos por uma liderança social, ele executa suas escolhas tendo como motivado os próprios interesses, as respectivas singularidades.

A cultura de massa impõe um padrão cultural e um modus operandi da sociedade concebida como um corpo, mas não consegue controlar totalmente os membros deste corpo, sendo os indivíduos os referidos membros. Fato que aponta uma fragilidade e uma força em toda organização social: um membro pode atrofiar o corpo social e corromper a ordem imposta, mas para ser eficaz ele precisa de aliados, formando assim um novo grupo, que precisará de regras gerais consensuais, estabelecendo então um paradoxo, onde para atingir interesse de suas singularidades, o ator social precisa tornar coletivo algo que é individual. O epicentro do conflito neste caso não é o interesse, tampouco o individualismo, mas o controle. O que antes era exercido pela força física, agora materializa-se nas entrelinhas de narrativas midiáticas e na ressignificação dos padrões.

Cada sociedade/grupo social possui seus padrões de saciedade e felicidade. O que outrora foi medido pela saúde, dentes, capacidade física, passou a ser por meio da posse de bens materiais ou mecanismos de poder (Mercado / Autoridade / Mídia / etc.). Assim, a construção da realidade social ultrapassa os aspectos da singularidade do sujeito, pois está ligada à interação dessas singularidades com a paisagem formada por oportunidades e demandas.

A globalização estimulou a integração de padrões territoriais de modo a possibilitar o diálogo de “tribos”, de suas demandas, anseios e oportunidades de saciá-las além fronteiras; considerando demandas e anseios nos aspectos culturais, econômicos, intelectuais, de subsistência e desenvolvimento.

Neste ínterim, a arte e suas diversas concepções, tornou-se instrumento essencial de manutenção dos padrões sociais; tanto para reafirmar quanto para romper paradigmas e sobrepor dogmas. Desta forma, a noção de identidade de um ator social depende de suas singularidades enquanto indivíduo e de sua interação na paisagem social, perpassando pelas influências em “si” dos produtos culturais que consome, acessa ou até mesmo reproduz. Isto pode ser observado nas dinâmicas de apropriação e ocupação territorial e interações consequentes, definindo regras e limites, espaço público e privado. Portanto, percebe-se cada vez mais que identidades culturais volúveis e segmentadas tomam lugar de destaque social ante as identidades culturais tradicionais, fato que evoca mudança na maneira de transmitir a história a gerações futuras.

Faz-se então relevante analisar o “Agenda-Setting” e suas reverberações na organização social, pois assim renovam-se identidades culturais volúveis e respectivos relacionamentos descartáveis. Teoria formulada por Maxwell McCombs e Donald Shaw, o Agenda-setting consiste na hipótese de que a opinião pública considera mais importante em seus assuntos diários os temas que são veiculados com maior destaque na imprensa; sendo que as notícias veiculadas e o foco das narrativas são determinados conforme singularidades de quem detém o controle dos veículos de comunicação ou até mesmo a setores de uma sociedade.

Indivíduos ditos pós-modernos apresentam-se em constante movimento em busca da identidade própria, seguindo tendências, outros repetem a receita dos padrões culturais vigentes e há ainda os de vanguarda, que se constituem solidamente, sendo ainda flexíveis evolutivamente e não volúveis apenas pela efervescência da mudança.
 

Felinos




Cultivava a diferença. Era o que sentia em suas veias. Era o que fluía em seus gestos. Não conseguia deixar de contaminar as pessoas com a leveza de olhar a vida. Eram rosas diferentes. Eram sabores diferentes. Eram pessoas exóticas pela peculiaridade de serem únicas. Ele não conseguia ser impessoal. Envolvia-se por completo, com intensidade, muitas vezes sem a devida sanidade, mas a pujança de um sentimento sem amarras, sem lógica, sem falsidades. Assim ele conseguia as marcas, pintura rupestre na derme, o tempo que passa revelando momentos de gozo e de dor.

O ritmo da caminhada. Impossível definir se é o prenúncio da fuga, da caça, ou de uma jornada compartilhada. O que há no olhar dos felinos? Hipnotizantes, sóbrios, poderiam eles nos falar sobre as consequências da vida? Explicar os desdobramentos das escolhas? O olhar de um cão compartilha do mesmo espaço tempo, troca emoções e percepções do presente, o dos felinos parecem vir de um tempo onde sabem o que somos, para onde iremos, e o que sentimos. Há felinos de olhos azuis, castanhos, verdes, que brilham, que ferem e afagam. Sempre instigam.

Certo como a luz do sol a passar pela fresta da cortina e se instalar sobre a mesa. O sentimento não era de dúvida. Tocou a mão dela e apertou por uns instantes, de modo intenso, com carinho, com desejo. Ela respondeu ao toque, não importava o significado, tampouco o porvir, valia mais o momento que experimentavam ali. Ela o olhava no escuro, entremeio flashs de postes, com um brilho nos olhos. Ele a olhava com ternura, segurando-se para não unir os poros, os lábios, os destinos.

Os ponteiros e o fatídico "mas" interrompeu aquele encontro, sem selo, sem ponto. Deja vu. Assim como cada qual vivencia diversos desses momentos em particular universo, eles tiveram novamente o seu momento. Complicado. As leis da física não consideram o poder da vontade e a interferência do pensamento. A memória construiu-se então de uma série de momentos que pela sutileza delineiam um sentimento que enobrece o olhar, o suspiro, a libido. O tempo apura este sentimento cada vez mais. Complexo.

Quando o exótico atrai pela diferença, pela inquietude que gera. Como um filme de Almodóvar integra ao nosso olhar um tom de estranhamento aos padrões sociais. Assim, os dias se renovam nesta orgânica festa que gira em torno da estrela.

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sexta-feira, 21 de outubro de 2016

polegares em riste



Geração dos polegares frenéticos. A dor de polegar tem incomodado mais do que a de cotovelo. Pescoços baixos fazem reverência a uma privacidade que brilha intermitentemente nas telinhas às mãos. A ergonomia é o novo desafio da saúde ocupacional, pode-se dizer que em determinados cenários sobrepõe até as famigeradas receitas de uma alimentação saudável. Todavia, esse recorte do comportamento social é a reverberação da mudança do processo de comunicação. As plataformas de produção e consumo de conteúdo, com suas multiplicidades de funções, acessibilidade e formatos, interferiu na postura moral e corporal dos indivíduos. Mudou a postura do corpo e a postura dos indivíduos na sociedade, uma vez que foram empoderados no processo de comunicação, podem postar, compartilhar e até mesmo interferir em pautas e respectivos desdobramentos. A responsabilidade social já não é apenas um jargão corporativo, mas a premissa para interagir socialmente  seja como indivíduo ou como representante de um grupo ou empresa. Aqui não se limita a concepção de responsabilidade social a ações de filantropia, mas de desenvolvimento integrado justo, e responsabilização pelos respectivos atos em sociedade.

Nova Ordem Mundial. Aplicativos a mil. Mensagens trocadas, arquivos que vazam de propósito, ou por incidentes, acordos firmados, registros apagados, rastros polemizados no judiciário, manifestações de bites, amores por código binário, traições por caracteres, transformação social digital, baterias viciadas, pessoas libertas de paradigmas, a rede que se renova e expande imitando o movimento do universo, com colisões, explosões e novos mundos; a beleza orgânica da vida na matriz do tempo.
Roger Bolton (referência em Relações Públicas do setor industrial nos Estados Unidos) disse que a contemporaneidade nos encurralou em uma máxima conhecida desde os tempos de academia: Temos que melhores naquilo que já éramos bons. A geração millennials alastra-se na contemporaneidade (jovens, empreendedores, irreverentes, desvinculados a padrões tradicionais, mas comprometidos com problemas de ordem global, com a efetiva sustentabilidade, de produtos e processos, inclusive de relacionamentos interpessoal e institucional.

Neste sentido, é preciso agir de forma simultânea às mudanças. Fazer a leitura da paisagem, considerar seus recortes e a interdependência e desdobramentos de tais recortes. É compreender como as pessoas se comportam nas Redes Sociais Digitais, nas Redes Sociais Orgânicas (Grupos sociais - escola, religião, lazer, cultura, esporte), a maneira que produzem e consomem mensagens, observar como concebem e percebem os espaços que ocupam, os produtos e etc. Simultaneamente, deve-se entender o respectivo lugar (do comunicador) e função na paisagem e ser volúvel (sem ser leviano)no ambiente, lançando mão de atitudes de vanguarda para interferir e também do mimetismo para aceitação e reconhecimento.

Além de estabelecer um novo modus operandi na comunicação, as novas mídias (se utilizadas de forma equilibrada) expandem as fronteiras da evolução humana e flexibilizam distâncias físicas e intelectuais para estabelecer aquilo que entendemos como um mundo melhor agora.

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sexta-feira, 9 de setembro de 2016

entre jardins



O que nos faz caminhar à terceira margem do Rio? Os sentimentos que lapidam nossa identidade ou a atrofia provinda de um cotidiano que soterra o indivíduo com tantos padrões? A música é mais do que um ritmo a movimentar corpos. A música transcende nossos pensamentos, sonhos e flagelos. Ela é capaz de nos libertar, ferir e confortar; compreender e questionar. Em alguns dias, ela pode até mesmo transportar nossa mente para longe de uma realidade exaustivamente sufocante.
Seja a partir das linhas libertadoras de Guimarães Rosa e as diversas possibilidades da terceira margem deste rio chamado realidade, ou no transcorrer de Severed Garden de Morrison, a mente fica inerte enquanto reverbera no corpo um pensamento transformador. O que “si” busca? Seja se encontrar, estar em paz ou até mesmo feliz.

A famigerada felicidade em sua utópica plenitude não deve ser considerada sobre os aspectos dos rótulos sociais presentes nos mecanismos de consolidação de padrões sociais (Escolas, Mídia, religião e famílias). O tão proclamado “conheça-te a ti mesmo” é fator determinante para alcançarmos o que sacia nosso coração e mente.

O processo de autoconhecimento nos possibilita aperfeiçoar a maneira como analisamos as oportunidades diárias, interagimos com o ambiente e rascunhamos o futuro nos gestos do presente. Simultaneamente, nos relacionamos com outras pessoas e interferimos na vida delas na mesma medida em que elas influenciam a nossa. E algumas pessoas são tão especiais, que transformam silenciosamente e permanentemente nossa vida. Independentemente do contato, estão sempre próximas, caminhando entre jardins e margens de nós mesmos.

Nesta noite, ouvir the Doors é se permitir a momentos de introspecção. Não uma apologia a rebeldia, drogas e sexo sem limites, mas uma argumentação a respeito dos paradigmas da sociedade, dentre eles o amor e a percepção da realidade. No compasso do pensamento, o ritmo dos sentimentos intensos. Com letras que vão desde a simples manifestação de um desejo, à possibilidade de refletir a respeito de significado e significante das coisas, as canções da banda evocam experiências interessantes para o imaginário de quem ouve com atenção.

Ouvir “Severed Garden (Adagio)" - canção estruturada a partir de poema gravado por Jim M. em dezembro de 1970, criada como música após a morte dele sobre uma recriação para “Adagio", de Tomaso Albinoni; é entregar-se à introspecção de rever silenciosamente nossas referências, valores e a respectiva relevância de escolhas e atitudes; desde o modo como observamos uma flor, lidamos com riquezas, reconhecimento, até como percebemos os aspectos e incertezas do relacionamento com os outros e até mesmo com a morte.

Neste ínterim, não é raro nos encontrarmos em busca de uma miragem. Seres humanos são fábricas de miragens. Alguns dizem que a busca pela miragem é o que move a sociedade e possibilita sua evolução. O foco na busca contínua, e não no alcançar. Entretanto, esse processo alimenta ferimentos e cicatrizes permitem a leitura em braile de nossas fragilidades; reféns de sonhos in natura. Há quem diga que se materializarmos aspectos da miragem na realidade que se apresenta palpável e perceptível (longe de ser concreta) conseguiremos estruturar um efeito placebo para vivenciar os dias com mais leveza.


Não podemos apenas nos entregar aos padrões vigentes e deixar que eles anulem aquilo que nos faz ser único; nem melhor, nem pior, mas especialmente único. Devemos nos abster da comodidade de catalogar tudo o que acontece como algo rotineiro. O comum é tão perigoso quanto a arrogância dos donos de verdades, ou controladores do processo de divulgação de versões. Alimentamos muitas vezes a característica que mais condenamos. Corpos destroçados, lares profanados, carteiras roubadas, espaço público tratado como a residência do caos, senso coletivo concebido como bacanal social. Na rebeldia não há poesia; há sangue. Alguém sempre verte sangue, nem que seja cortando o dedo com papel. As cenas brilhantes de filmes violentos, onde o espectador torce até mesmo para o inimigo público, não se limitam à sétima arte. Elas sumarizam os jornais, aterrorizam nosso dia a dia. Contraponto. Crianças espontaneamente boas, cordiais; casta superior quando exala humildade. Elas vão além da soberba dos adultos em dominar e impor verdades. A ambição de sorrir. Elas são delicadas flores perfumadas em um jardim; e cada qual tem seu jardim, que une e nos separa uns dos outros.

Textura, movimento, sabor e ternura. As experiências que um jardim evoca no indivíduo vão além de aspectos visuais e conceitos erguidos em versos. Encontramos aconchego não em lugares determinados por padrões sociais, mas essencialmente onde nos toca a alma. Alcançamos e somos alcançados pela paz quando livre de amarras nos envolvemos no suave emaranhado de possibilidades de ser feliz.

Os pensamentos estão postos. Despertar é uma palavra-chave muitas vezes inserida em fechaduras erradas. É preciso foco para persistir; mais do que saliva. O interesse. O fruto que geramos e que somos. As ações que exemplificam nosso caráter. Relacionamento e confiança são mais do que lembranças, ou palavras soltas em uma camiseta. Para alguns é moeda de troca, para outros é fundamento divino.

“Não há amor possível quando se busca a miragem e não a pessoa concreta que se tem diante de si”. (Sérgio Abranches, in 'Que mistério tem Clarice?').

Será?

“I want roses in my garden bower, dig?”

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segunda-feira, 30 de maio de 2016

Bias tão nossas


 

Tantas são elas, que controlam nosso corpo, delineiam no horizonte o alcance de nossos braços, o ritmo dos passos e a ousadia dos olhares. Fazem morada no indivíduo a ponto de se confundir com a identidade de quem as possui, ou por elas são possuídos. Entrelaçados a elas buscamos aprimorar o reflexo do espelho sem nos ferir gravemente com os cacos. Bias, tão nossas. Bias nada fofas que dão medo "Medo que dá medo do medo que dá".

As ruas e noticiários têm sido pautados pelas nossas fobias. Lampejos de virtudes, de harmonização social até incitam certo frescor no olhar, mas, no entanto, nossas fobias nos pautam. Seria bom se fosse para refletirmos sobre como vivenciar e transpor as intempéries das fobias; mas o que vemos é o registro das consequências de medos maturados em seres despreparados. Pessoas queimadas, corpos mutilados, redes sociais congestionadas, diálogos violentados, matriz energética estagnada, ciclistas, motociclistas, pedestres e motoristas em vias de guerra, guerra urbana, umbigos gritam em palanques, cidadania encarcerada, relacionamentos dilacerados por um utópico e cruel bem comum, que não vem.

Percebemos a fobia como a expressiva materialização da angústia de um medo; vemos o empoderamento de uma castração psicológica que porventura pode estar em segundo plano na mente do indivíduo, mas que é base para as atitudes quase que automáticas; com consequências que transformam não apenas a identidade e caráter de seu possuidor, mas que reverberam no ambiente e em seu respectivo equilíbrio.

As atitudes provindas delas são recorrentemente um instinto de autopreservação que muitas vezes gera agressão ao próximo. Esse medo de que sua identidade e seus valores percam espaço na organização social, de forma a ter supostamente corrompidas suas virtudes, diminuídas suas articulações políticas e sociais, faz com que o indivíduo rejeite a diferença, obstrua o caminho da diversidade, e levante o estandarte de uma moderna inquisição, onde a intolerância grita e pune contra o outro, contra o plural. Mas a existência do diferente não pressupõe que seja soterrado ou exterminado o outro, na verdade se trata de uma flexibilização de perspectivas. Há espaço e tempo para todos.

"Tienen miedo del amor y no saber amar / Tienen miedo de la sombra y miedo de la luz / Tienen miedo de pedir y miedo de callar / Miedo que da miedo del miedo que da (Miedo - Lenine - composição: Pedro Guerra/Lenine/Robney Assis)"

Dalgalarrondo (2006 - apud Mira y López 1964) apresenta o medo como uma alteração dos aspectos emocionais que desencadeia em escalas até a sua inativação, tomando determinada proporção até que o indivíduo alcance estabilidade. Essa leitura concebe seis fases de acordo com a intensidade e abrangência: 1. Prudência; 2. Cautela; 3. Alarme; 4. Ansiedade; 5. Pânico (medo intenso); 6. Terror (medo intensíssimo). Sendo assim, as fobias podem ser encaradas como medos exorbitantes, descomunais, desproporcionais, atrofiadores. O contato com o objeto de fobia estabelece crise, com profunda inquietação e ansiedade por parte de quem possui a fobia. Neste instante de pânico não há lugar para a razão e sobriedade, mas apenas o raciocínio lógico de se livrar do objeto da fobia, seja impondo distância, fugindo, ou agredindo, tentando extirpar da existência. Neste sentido, é possível estabelecer uma relação preliminar: Fobia – Julgamento (da situação) – Punição (do objeto que causa fobia). Essa punição é materializada na intolerância.

A matéria de capa da Revista Puc Minas (Intolerância – Profunda reflexão sobre atitudes hostis e desrespeitosas que têm marcado o mundo contemporâneo. Ed 13 – 2016) apresenta de maneira contundente como “nossas bias” têm interferido na sociedade por meio de uma intolerância enraizada, que abrange aspectos religiosos, políticos, sexuais e raciais. Intolerância essa verificada em gestos, em vocabulários, conceitos visuais, e ordenamento social, estabelecendo-se como fator cultural. No contra-fluxo das atrocidades humanas está o processo de renúncia e denúncia. Denúncia por meio de multiplataformas (oficiais ou não) e renúncia (por meio de movimentos de contracultura) a um padrão de comportamento que só nos distancia do famigerado mundo melhor.

O que seu medo te impulsiona? No que ele te castra? Como ele torneia sua personalidade? Medo ou fobia de insetos, de situações, de ambientes, de sensações, de cheiros, materiais, de sons e até mesmo de sabores. Uma breve pesquisa na internet e você encontra listas de fobias (cada um que até impressiona existir). Contudo, assustador é observar e presenciar como os desdobramentos do medo da diferença, o medo de não controlar e sim ser parte integrante de um grupo social, traçam a realidade. Desdobramentos que podemos resumir em fobia de pessoas. Homofobia, Heterofobia, Transfobia, Politicofobia e polifobias possíveis. Bias traiçoeiras, desde o modo como se instalam na sociedade, até a estratégia de disseminação e ideais para contaminação de novos adeptos. Que as fobias recorrentemente trabalhadas no agenda setting possam nos provocar a uma efetiva melhoria, a partir de pensamentos consonantes para aceitação do plural, contribuindo para uma evolução continuada do modo de perceber a vida e se integrar à paisagem, relacionando uns com os outros sem se perder em utopias, mais ainda assim permitindo sonhos que libertem-nos das bias e elas de nós.

 
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sexta-feira, 13 de maio de 2016

rsrsrsrsrsrss


Desde a primeira vista, algo aconteceu .... será que entendi errado?

Visualiza e ignora. Olha altivo e ignora. Quando sua risada desce como ácido sobre mim, não reconheço seu rosto; não sei quem vive em meu reflexo. Mesmo tendo firme as volúveis convicções, sou soterrado por palavras que nem ao menos fazem algum sentido. São estruturas ocas de um suspiro transviado. Exposto, parece que entendi errado. Será? Intenso, implodi no silêncio o gesto. O controverso sabor amargo me encanta, fascina e me atordoa. O dissabor de uma constatação, o golpe de uma frase encaixada onde não deveria estar. Arestas que arranham os sonhos deixando-os fustigados, sangrando esperança em um dia tão lindo, em que as cores parecem cantar a quem por elas passa. O tempo passa; ao passo do tempo as perspectivas se alternam. Mãos dadas no horizonte a envelhecer. Dadas mãos juntas a aquecer mais do que lembranças.

A fria tela de um celular, tv ou tablet não se compara ao frescor da madrugada que recebe meus sonhos... o toque suave do lençol sobre seu corpo tampouco se assemelha à textura do encontro de nossos poros entremeio ao toque do lençol sob nossos corpos. Sonho intenso que além de perfume traz as flores, pétalas, espinhos e continuidade, na cumplicidade de sentir renovar o sentimento que nos alimenta o olhar. A respiração que busca ar em seu ritmo de querer mais. os cabelos, as curvas, os encaixes e suspiros.O seu contorcer, o tremor que percorre suas planícies, planaltos e vales... ser lida como merece, sempre e não apenas em um instante. Toda vez que leio seus rsrsrsrs imagino o canto de sua boca receber um doce sorriso faceiro. Daqueles que escondem mais do que revelam. Daqueles que revelam sentimentos e sensações, seus pensamentos mais íntimos, particulares. Aquele faceiro sorriso que manda na brisa sua impressão de um mundo inteiro. Traduções que penso nunca obter, essas dos seus sorrisos de canto de boca, a me encantar além da rima, a delinear um divino sentimento.

Sentado ao seu lado, podia desfrutar da pele viva e linda, do olhar de entrega, da doce voz, das frases bem elaboradas, dos argumentos interessantes, dos anseios e olhares sobre a vida, do sorriso que me castiga ao dominar minhas reações. Percebo-me de volta aos primórdios, à primeira infância, na fase oral, com vontade de morder, de gravar-me em você. Vontade de sentir suas unhas cravarem em minhas costas o elixir da humanidade. Esse sentimento quase antropofágico representa a entrega, desejo, paixão, manifestada em um gesto primário de se integrar ao desejado. Esse integrar-se inspira o amor que poucos experimentam.

“Se ‘você é tão café’ é um elogio; ‘você é tão cappuccino’ chega a ser indecente. Imagina com chantilly e raspas de chocolate meio amargo” E Deus rege o tempo,  nos tempera, nos prepara, nos ensina.

Imagina uma pêra. Madura, suculenta. Lábios se aproximam, respiração muda, boca entreaberta revela os dentes, o prenúncio de uma mordida. Dentes a cravar na pêra que sucumbe seu delicioso caldo entre os lábios que a devoram com intensidade, com entrega. A respiração levemente quente entre teus vales, a boca que flerta com o oásis que sem saber já pressente que está prestes a jorrar, e o corpo treme. Novas fronteiras.

As mãos entrelaçadas são muito mais do que química, vai além do presente; tem se firmado ao longo do tempo como algo que amadurece, se faz perene, com morada no sempre.

O nobre metal que vence as provações, reluz e simboliza o sentimento que não fica para trás, mas continua, cresce.  Afora toda demagogia, reles poesia e declarações superficiais, ele sobrevive. Mesmo que não se materialize como a sociedade está acostumada, ou concebe moralmente.  "Pássaros criados numa gaiola acreditam que voar é uma doença” Alejandro Jodorowsky. Como disse um anjo: "ou não sabem ou tem medo de tentar".

Dentro de um carro, outra dimensão se faz possível; uma onde não é necessário explicar o que se sente e dar satisfação ao outros lacrando-se em infelicidade. Anos atrás... Dentro de um carro minha perna toca a sua, meu olhar encontra o seu, seus lábios entreabertos parecem balbuciar algo, a chama interior, ou o beijo. Eu pergunto o que foi, você responde “NADA” e aquele nada adormeceu até que o tempo nos levasse novamente àquela dimensão. Dentro do carro, minha mão tocou a sua. Despertou algo que não se acabou com o tempo, mas se aprimorou. Cresceu! O tempo que levará os passos para alcançar os sonhos difíceis não sei, mas me entrego a eles, reconhecendo-me como alguém que não sabe o futuro, mas é intenso ao viver, sentir e sonhar.

Suas mensagens, suas fotos. Guardo como recomenda Antônio Cícero (não escondendo, mas olhando e admirando). Todavia, os seus rsrsrs me perseguem nas madrugadas, nas manhãs e tardes onde meu silêncio contemplativo da natureza rompe-se com meu sorriso de canto de boca ao lembrar do seu.... rsrssrsrsrs

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quarta-feira, 11 de maio de 2016

Fantástica fábrica de ilusões



Os aspectos que nos fazem humanos, orgulhosos do que vemos no reflexo do espelho d´água, hora ou outra se contrastam com nuances de nossa vergonha, peculiaridades de uma personalidade que buscamos aprimorar.

O referido aprimoramento nem sempre tem o mesmo ritmo e intensidade que poderia provocar uma efetiva mudança, no entanto já se estabelece como um suspiro da esperança. Suspiro que reverbera e ganha força em narrativas que perpassam gerações.

Assistir, re-assistir e assistir outra vez a Fantástica Fábrica de Chocolate (1970 e 2005) deixa um sabor de quero mais na boca, aquela pequena e intensa fisgadinha no final da língua, onde fica o sabor do "quero mais". Desperta o desejo de revisitar nossos valores, os personagens que assumimos no convívio social e nossa relação com o prazer.

Em 1970, a narrativa mostrava o valor referencial da família como base para buscar melhores condições de vida, em contraplano com o egoísmo e dissimulação presente no ser humano. A história corre sem explicar muito sobre passado e futuro, sem dar detalhes da origem familiar de Wonka e sem especificar demais as mazelas vividas pela família de Charlie, tampouco os desdobramentos após ganhar o prêmio. Durante o filme, a honestidade de Charlie e dos outros é testada não apenas para conseguir um produto secreto, mas especificamente atacando as fraquezas e prazeres individuais.

Em 2005, percebe-se foco maior sobre história e valor da família tendo que especificar origem e futuro, estabelecendo e resgatando referenciais morais, abordando temas como redenção entre pai e filho, fortalecimento de elos verdadeiros  de amizade, de contato humano, de resgate da essência, mostrando inclusive os desdobramentos após Charlie vencer. Na trajetória, o contraplano à ambição dos personagens pela posse desenfreada, pelo transpor limites estabelecendo as próprias regras (pautadas na arrogância egocêntrica).

Após subir os créditos, além das canções das duas versões, ressoa um pensamento sobre como podemos nos encontrar entremeio ao turbilhão de informações, demandas, sonhos e realidade da contemporaneidade. Como aperfeiçoar o ser humano que somos a ponto de contribuir para as relações sociais e principalmente com aquela sensação de satisfação que tanto buscamos antes da última piscada do dia.

A cada mordida em um chocolate (impossível não comer após ver e pensar no filme) a língua se envolve com um sabor que não se adequa a palavra alguma, assim como o ser humano em sua totalidade não se adequa a nenhum rótulo ou regra. A transitoriedade da personalidade humana sobre o tempo e contexto social revela a esperança de que algo não necessariamente novo possa ser efetivo instrumento de evolução, de mudança. Talvez seja a premissa para perenidade de sonhos e vidas, outrora pode se tornar argumento de ilusões que mantém funcionando os pulmões.



Sobre:
Willy Wonka and the Chocolate Factory (pt-br: A fantástica fábrica de chocolate / pt: A maravilhosa história de Charlie) é um filme musical dirigido por Mel Stuart e lançado em 1971, estrelando Gene Wilder no papel de Willy Wonka. A história é baseada no livro infantil Charlie and the Chocolate Factory de Roald Dahl (autor também de Matilda), publicado em 1964, contando a história de como Charlie Bucket encontra um "Bilhete Dourado" e visita a Fábrica de Chocolates Wonka com outras quatro crianças. Em julho de 2005 estreou a versão de Tim Burton, com Johnny Depp no papel de Willy.


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sexta-feira, 15 de abril de 2016

Onomatopeia da vanguarda


As pessoas seguem compartilhando códigos, o emoji se instala em todos os diálogos. Abreviações das narrativas, significação dos sentimentos e pensamentos como era no princípio agora também no fim(?) mas com direito a backup digital.

O contexto é a codificação essencial para viabilizar a plena comunicação (garantindo reverberar o conteúdo e possibilitar a interpretação das mensagens). A contextualização passa, essencialmente, pela utilização de mecanismos tradicionais de narrativa: Texto ou fala. Dessa forma é possível a ambientação de linguagem.

Considerando as nuances de um diálogo pleno tão buscado em relacionamentos pessoais e corporativos; qual o emoji do silêncio? Esse aspecto tão importante no diálogo, permitindo absorção de ideias, organização de argumentos, respiro e retomada de interação. Concebendo aqui o diálogo pleno como aquele que possibilita diversidade de vozes e silêncios.

O novo encanta à medida que também assusta. Ele liberta, agiliza, conforta, tanto quanto acomoda e atrofia. As pessoas entregues às novas plataformas de comunicação recorrentemente se abstém de premissas elementares para o processo de comunicação. Desse modo não há um desenvolvimento estrutural das relações e dos diálogos, mas apenas uma mudança no fluxo das mensagens, em volume, forma e intensidade; sendo que o conteúdo, suas interligações e reverberações desconsideradas e eximidas de qualquer ação de planejamento.

Esse planejamento estratégico não precisa ser apenas algo macro, com antecedência, mas também algo específico e instantâneo; em pílulas. Para isso, o indivíduo precisa ter um repertório e sistema de relevância que o capacite a fazer esta análise.

As organizações, ao se instalarem em uma comunidade, pouco se atêm em pensar no legado a ser construído naquele ambiente. A visão de futuro contempla a perenidade econômica e produtiva do empreendimento e não os aspectos sociais pertinentes a um processo de relacionamento e comunicação sustentáveis. Quando abordam a área social, as empresas buscam mitigar impactos de sua atividade e não fazem uma leitura sincera e real da paisagem, identificando as demandas e oportunidades de ação.

O transitar a margem e o epicentro das narrativas precisam ser constantemente considerados na manutenção dos processos de comunicação, gestão pública, relacionamento institucional e ordem social.

A escritora Alexia Clay, ao afirmar que as respostas para crises globais e locais podem estar em quem não se encaixa no ambiente, ou seja, na inquietação, reforça a visão de Albert Camus e sua visão do estrangeiro. O estrangeiro traz no seu olhar o equilíbrio e a solução para as circunstâncias. Pois ele consegue observar o sistema, seus fluxos, brechas e contrafluxos. Assim, é possível uma intervenção que possibilite ruptura e desenvolvimento estrutural. Neste ínterim, importante ressaltar que todos podem ser estrangeiros. Esse desajustado em relação ao sistema vigente, ao causar interferências e contribuir na superação das crises (sociais, políticas, econômicas e de comunicação) participa simultaneamente do estabelecimento de um novo modus operandi. Dessa forma, os desajustados tornam-se ajustados, a serem sobrepostos ou questionados em um novo cenário de crise, por novos estrangeiros (ou desajustados) que podem tanto acrescentar algo novo, quanto resgatar o que era dantes.

Contudo, ao observar as tentativas (às vezes espontâneas) de modernizar os processos de comunicação e relacionamento social e institucional a partir de novas plataformas, percebe-se que as mensagens recaem sobre a utilização dos mesmos mecanismos: códigos infográficos que carregam um significado interligado ao perfil referencial de um grupo social ou uma massa de usuários.  Esses novos hieróglifos que marcam as mensagens usadas pelas pessoas e até mesmo testadas por empresas anseiam ser a onomatopeia de uma vanguarda que não chega, mas que não pode deixar de ser buscada, uma vez que o processo de busca possibilita a evolução.
 
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