quarta-feira, 22 de maio de 2024

Ouço

Ouço teus sons, pássaros, na sinfonia do dia. No silêncio das mecânicas criadas pelos homens, a musicalidade do dia. A água que corre, pinga, bate, que encharca o pano que canta ao ser espremido em desabafo de lágrimas de um coração que não segue conceitos, não segue o tempo, apenas bate. Bate, e para. Ouço você natureza a me rodear, a me assistir enquanto assisto você. Sinto você me integrar, me energizar quando simplesmente nu toco sua superfície em silêncio. Minha mente agora repousa na paz de estar sem os atropelos aos quais me proponho todos os dias. De maneira então nova para mim, começo a me reconhecer, começo a me encontrar, no portal de minha velhice, talvez agora minha sanidade.

Chego a algumas ponderações sobre minha passagem na vida de alguns estereótipos recorrentes em minha vida. Percebo uma certa funcionalidade de minha interferência nas respectivas histórias. Todavia, as fissuras que ficam em minha alma são irremediáveis até então. Cada ajuda um golpe, pois me envolvo emocionalmente a tal ponto de fantasiar o voo do beija-flor para dimensões nunca vistas. A queda tem o gosto amargo da solidão, imposta pelas ilusões. Ilusões que propulsionam minha entrega em ajudar, em admirar, em cuidar, em me entregar e assim fazer pelo o outro. Cumprido o propósito, volto ao estado de espera. Mas como prosseguir na existência em constante estado de espera em ajudar o outro? O café na garrafa vislumbrando a xícara, a flor dançando ao vento exalando o néctar e pólen à espera de um pouso, um beijo; as águas a se movimentarem para o mar e perceberem seu sabor mudar, seu formato mudar, se infiltrar, se esconder, aflorar, evaporar para chover, se vier a ser chuva. 

O quanto você se interessa além da imagem que o espelho revela? O quanto está disposto a refletir à medida em que também vive é uma das questões que podem nos colocar em movimento. Escrevo de mim, para mim. Escondo nas entrelinhas quem eu sou e o que sinto, para quem possa merecer retirar esta espada da rocha, seja digna da interminável fonte de amor e devoção.

No meio dos textos, sinto meu corpo se desfazer. Na esperança de acolhimento e entendimento, percebo minhas palavras perderem todos os sentidos. Essa sensação estranha causa rasgos ainda maiores na paisagem de minh'alma. Que canção poderia reconstruir, que olhar poderia me salvar, que salvação se espera e um quadro pronto?

As expectativas. O ritmo acelerado. Queira saber lidar melhor. Tato. Cheiro. O balanço do silêncio, poros vizinhos, erguidos no ambiente sem rimas e julgamentos. Acostumei-me a viver perpassando tornados. 

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