quinta-feira, 16 de março de 2017

Estado Poder e Bem-estar


Antes de olhar o Estado e suas configurações, olhar o indivíduo. Pensar o querer geral e ser racional (lembrando Immanuel Kant) e também perceber a relação dos seres com os espaços a partir do interesse e suas vertentes diversas. Os indivíduos com objetivos específicos, interesses pessoais se tornam seres sociais. Os seres sociais buscam estabelecer um ordenamento embasado no interesse coletivo. Todavia, o interesse coletivo é por muitas vezes uma roupagem aceitável do Interesse Dominante. Ou seja, um indivíduo articula seu interesse pessoal de forma a viabilizá-lo como o interesse de um ser social com potencial de se transformar em interesse coletivo. Por persuasão, submissão ou identificação para alcançar fins pessoais, outros seres sociais tornam-se adeptos do interesse proposto tornando-o Coletivo. Quando analisado em profundidade, este interesse nada mais é do que o interesse dominante não de um grupo, mas de um ser com poder articulador às vezes imperceptível em sua ação, mas evidente em suas consequências.

O aspecto moral dos modelos de socialização do poder e modelamento econômico deve ser considerado para redefinir a Ordem Social de forma a fortalecer o Estado Contemporâneo, conforme aborda Keynes, baseado em liberdade (livre mercado) com maior participação do Estado (moderador). Essa base liberal onde acesso e oferta são instrumentos de moderação do Estado merece atenção para compreender os desdobramentos na contemporaneidade. Keynes defendia processos abertos, passíveis de manutenção (ex: capitalismo) onde a liquidez é uma instância de consumo, entre o presente e futuro.

As demandas sociais pertinentes são então vistas como questões periféricas. Atributos como o Pleno Emprego se instala como elemento fundamental para o bem-estar social. Assim, os mecanismos de controle do planejamento político evocaram dos players maior conhecimento e domínio de mercado e finanças (Uma vez que o estado na era do Welfare não controlava efetivamente as práticas econômicas privadas, nem sob o aspecto de produção), e compreender modelo de negócio (produção / demanda / mercado / consumo). Neste cenário, com a premissa de exercer o referido controle e participação, o Estado busca promover melhor distribuição e organização dos recursos e promover melhorias na remuneração em busca do Bem-estar social. Lembra muito o projeto de Renda Mínima do ex-senador da república Eduardo Suplicy (Renda de Cidadania: A Saída É Pela Porta). Realidade ou utopia? Mecanismo de alienação ou acesso social a recursos?
Reformas sociais então transitam entre assistencialismo e distanciamento social sob um viés de redistribuição igualitário de recursos e riquezas, com nuances de concessão de poder, nem que seja de consumo.

As configurações do poder esbarram em aspectos recorrentes da organização social, em função de muitas vezes serem especificidades do ser humano. A estabilidade (via plano emprego) tornou-se, na contemporaneidade, o "ouro de tolo" da população, manejada agora por uma nova configuração política. Configuração na qual a esquerda, ou nova esquerda como se refere o autor (Deborah Farah) surge com um viés mais articulador do que extremista, fugindo de um capitalismo radical e de um socialismo burocrático por demasia. A demanda pujante por um novo Estado reflete o nascimento de uma nova sociedade, com outro poder de posicionamento de suas demandas e modo de exercer pressão. Há então uma demanda significativa por mais agilidade na dispersão e homogeneização social das narrativas de poder e controle; fato que pressionou mudança em plataformas e narrativas de comunicação e repasse de informações. A massa exerce pressão sobre o Estado em busca de respectivos direitos.

O Estado então, decisório da política, precisa de uma licença social. É necessário que a população (concordando ou não) aceite e valide o processo político para que a diretriz do estado seja executada e permaneça vigente. Os conflitos sociais que antes perpassavam o choque entre classes (Burguesia e Operariado) agora se instala em individualidades e seus valores (gênero, sexo, profissão, e etc.) e não em ideologias de massa. Portanto, entidades representativas, tais como Sindicatos, perdem poder de mobilização e interferência, fato que leva o Estado a formar redes de colaboração com a iniciativa privada, essa que se tornou parceira mais presente nas políticas públicas. A voz da sociedade, sua participação, é compreendida então pelo Estado como algo fundamental para a construção da democracia, porém arbitrariedade (exercida pelo Estado ou órgão regulador) é o que regula e viabiliza processos democráticos.

Como já disse em outro texto, a globalização estimulou a integração de padrões territoriais de modo a possibilitar o diálogo de “tribos”, de suas demandas, anseios e oportunidades de saciá-las além fronteiras; considerando demandas e anseios nos aspectos culturais, econômicos, intelectuais, de subsistência e desenvolvimento.

Neste ínterim, a arte e suas diversas concepções, tornou-se instrumento essencial de manutenção dos padrões sociais; tanto para reafirmar quanto para romper paradigmas e sobrepor dogmas. Desta forma, a noção de identidade de um ator social depende de suas singularidades enquanto indivíduo e de sua interação na paisagem social, perpassando pelas influências em “si” dos produtos culturais que consome, acessa ou até mesmo reproduz. Isto pode ser observado nas dinâmicas de apropriação e ocupação territorial e interações consequentes, definindo regras e limites, espaço público e privado. Portanto, percebe-se cada vez mais que identidades culturais volúveis e segmentadas tomam lugar de destaque social ante as identidades culturais tradicionais, fato que evoca mudança na maneira de transmitir a história a gerações futuras.


Outro viés da Globalização é a mudança do mercado e seu controle. Pois agora a demanda não dita as regras, mas os fluxos de sobrevivência e competitividade também interferem no processo, uma vez que geram fluxos que vão além de demandas existentes, criando outras "necessidades" que até então a sociedade não imaginava e o Estado nem concebe uma forma de gerir, moderar ou participar. Esse novo cenário propicia mudanças nas relações de trabalho e dispersão de produção e produtos, com certa flexibilização que reorganiza o consumo. A nova organização econômica passa então empodeirar o sujeito enquanto consumidor de inovações, gerador de novas demandas. Estabelece-se assim nova ruptura no modelamento estrutural do Estado, que vê suas premissas escorrerem junto à chuva da vanguarda.

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sexta-feira, 10 de março de 2017

cortejo



O dia em que me mataram não foi um dia. Não foi o clichê de um livro autoajuda, com uma mensagem refrescante de um revigorar do empoderamento. O dia em que me mataram, com minha ajuda, foi mais um momento sublime no mundo. Belo.

Furtaram de meus lábios as belas palavras para fazerem florir os jardins que despetalaram; drenaram de meus poros o suor para seus templos, seus relatórios, gozos, suas alianças forjadas no egocentrismo. Sobrou-me as migalhas da confusão, os conceitos desprezíveis de uma frase, os adjetivos que não harmonizam ao paladar.

Castraram o olhar, dobrando o horizonte. Amarraram o sorriso na amargura de sempre quererem mais, e nunca alimentarem a fonte dos sorrisos. O amor... esse, eles torturaram de todas as maneiras que dispuseram. Permiti na esperança de que um dia acordassem, e refletissem e mudassem. Permiti na esperança. O credo que cravou minha história em minhas rugas, meu silêncio em minhas limitações. Não foi um roubo, não foi um crime, foi uma mais ação de sobrevivência daqueles que perpassam minha vida, assim como a de tantos. No ínterim dos últimos suspiros veio-me a indagação sobre quem ajudei a matar, quem matei, simultaneamente ao meu processo de morte. Somos interferências e não paralelas, somos intercessões inomináveis.

Esse cortejo é poema, é o cortejar a donzela de vidro trincado a ferir meus versos. A felicidade de um bom olhar, o sorriso prestativo, a intensidade de amar, de ouvir, de buscar e de ser.

O domínio da luz do sol sobre as plantas, o domínio de seu calor sobre mim. A chuva delineando meus poros, inundando minhas ideias e contendo meus passos. Não corro. Banho-me. A natureza me envolve como parte dela. No vento estou, nas migalhas da paisagem, no perfume que vem sem anúncio, sem paradeiro.

segue-se

domingo, 26 de fevereiro de 2017

és texto



Uma tristeza sem anúncios se instalou no instante; intensa, sorrateira. Sem movimento, ela interferiu no olhar. Assim, as cores apresentaram uma tonalidade que não conheci. E o perceber o tempo se tornou um exílio.

Carne, corpos e escolhas. Transeuntes de um hall que esconde vaidades, necessidades, desejos e aflições. Narrativas pontuadas pelo corpo que fala, pelos gestos, pelas roupas, pelos cheiros, e silêncios. Transeuntes são estandarte de um estilo, pintando a diversidade dos saguões. Observo. O sentimento é refém.

O cansaço e o aprender a descansar. Destroços e distrações.
Reluz então o esplendor pujante que me refaz escolhas.
és tu texto, impregno-me de ti
e ler é tornar-se cúmplice do porvir...

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segunda-feira, 20 de fevereiro de 2017

Títeres


Espera-se compreender o ser humano e o desdobramento de suas ações na manutenção da sociedade. Para isso, faz-se necessário observar suas diversas relações e padrões de comportamento e evolução. Alguns sociólogos e antropólogos acreditavam que para atingir a desejada análise do ser, era necessário destituí-lo de tudo que o compõe e observa separadamente e depois verificar o conjunto. Uma busca por constantes universais do traço humano.


As constantes universais não se constituem a melhor estratégia para compreender a constituição do ser humano. Clifford Geertz já afirmou que “pode ser que nas particularidades dos povos sejam encontradas algumas revelações mais instrutivas sobre o que é genericamente humano” (GEERTZ 1989).


Assim, ao observar o modus operandi do indivíduo enquanto sujeito social, percebe-se que ele alterna entre momentos de busca por poder e transferência de poder para evitar desgaste e obter zonas de conforto.


No que concerne a representação social, importante verificar a personifersonalização política reflete uma busca humana por referenciais que guiam e representam a massa em cenários complexos. No entanto, quando direcionado o referencial para um personagem, se ele cai moralmente, corrompe uma ideologia e rotula os representados. a transferência de atribuições e responsabilidades faz com que um personagem esteja acima de grupos. A individualização da representação social propicia o colapso moral do que se entende como sociedade. No entanto, esse processo é característica humana em busca de referenciais.


O processo supracitado favorece também à alienação. Um exemplo pode ser observado no comportamento social nas eleições. O desconhecimento sobre o funcionamento do processo político das listas fechadas e abertas e voto de legenda faz com que a tradição por personalizar eleja famosos e emposse oportunistas de baixa representatividade. Deste modo, nada muda; enquanto se depositar a esperança de um mundo melhor em um personagem, um salvador, e não em uma instituição política comprometida com demandas e valores sociais. A massa busca por um Messias, mas elege sempre um Pilatos, aliando-se a Barrabás. Revisitar a história política no Brasil e no mundo e transitar por trajetórias pessoais que interferiram na ordem social com o pretexto de defender interesses coletivos. Pense em épocas e lembrará de nomes  ao invés de pensamentos. O ser humano vive em busca de referenciar tudo o que vê e conhece,e se possível personaliza, delegando funções que o permitam voltar para zona de conforto social.


A construção do ideal a partir de uma personagem tem causado furor social no Brasil, pois uma ideologia e plano de governo não pode ser preso, ou ter a vida pessoal desmoralizada, mas um personagem sim. As recorrentes investigações em diversas esferas, com punição, prisões e até mesmo desconstrução dos personagens eleitos têm exigido da população uma reflexão sobre os referenciais, a busca por novos personagens e até mesmo um novo olhar sobre o modelamento político social, que deve transitar da personalização para uma madura cultura colaborativa, talvez como no visionário La Belle Verte (França: 1996 Dir. Coline Serreau).


Portanto, para melhor conceber uma percepção do ser humano no processo de personalização de sua  na sociedade, definindo um sujeito como soberano das decisões da massa, é fundamental fazer uma leitura de paisagem, mais abrangente, compreendendo a formação da consciência crítica e como se forma a esfera e opinião pública.


  • Opinião Pública - (não)


“A esfera pública pode ser descrita como uma rede adequada para a comunicação de conteúdos, tomadas de posição e opiniões; nela os fluxos comunicacionais são filtrados e sintetizados, a ponto de se condensarem em opiniões públicas enfeixadas em temas específicos. Do mesmo modo que o mundo da vida tomado globalmente, a esfera pública se reproduz através do agir comunicativo, implicando apenas o domínio de uma linguagem natural; ela está em sintonia com a compreensibilidade geral da prática comunicativa cotidiana.” (HABERMAS, 2003: 92).


Considerando a imprensa, a mídia, o termômetro e cajado social, é relevante ver à luz da escola de Frankfurt, a maneira que a comunicação interfere e modula a política social. Trata-se de um olhar que vai além da teoria do agendamento (Agenda Setting) mas que consegue observar os discursos serem embalados em uma narrativa que transforma um interesse segmentado (ou até mesmo individual) em patrimônio cultural da massa, interferindo assim nos padrões de comportamento social. A mídia alimenta o que condena para manter-se no fiel da balança de interesses. Com o avanço das plataformas, o ciberespaço e a inteligência coletiva (conforme concebe Levy) tornou-se palco do fazer político, empoderando a comunicação. A organização política ganha assim novas nuances de articulação com as novas plataformas e linguagens de comunicação. A interação social então é contaminada pelo repertório de cada indivíduo, mas elementarmente pelo que considera coletivo, público ou privado; seja o espaço, seja o discurso.


Então emerge, na Era da Informação, a dicotomia entre Opinião Pública e Opinião tornada pública (Publicada). A autonomia da população e sua pública opinião é questionável, uma vez que é orquestrada pela mídia. É possível verificar então um processo de teatralização dos discursos. A opinião pública não existe para Bordieu, pelo menos não como concebem e defendem os meios de comunicação e pesquisa.

Uma das dimensões muito importantes da teatralização é a teatralização do interesse pelo interesse geral; é a teatralização da convicção do interesse pelo universal, do desinteresse do homem político – teatralização da fé no padre, da convição do homem político, de sua confiança naquilo que faz. Se a teatralização da convicção faz parte das condições tácitas do exercício da profissão de clérigo – se um professor de filosofia deve parecer acreditar na filosofia -, é porque é a homenagem fundamental do personagem oficial para com a autoridade; é aquilo que precisa conceder à autoridade para ser uma autoridade, para ser um verdadeiro personagem oficial. O desinteresse não é uma virtude secundária: é a virtude política de todos os mandatários. As escapadelas dos padres, os escândalos políticos são o colapso dessa espécie de fé política na qual todos estão de má-fé, a fé sendo uma espécie de má-fé coletiva, no sentido sartriano: um jogo no qual todos mentem a si mesmos e aos outros, sabendo que os outros também mentem a si mesmos. (Bourdieu 2012)

"Um homem oficial é um ventríloquo que fala em nome do Estado" (BOURDIEU 2012). A comunicação política  deveria atuar como instrumento de esclarecimento e embasamento para a opinião pública escolher os rumos da sociedade. Além de instrumento de argumento para tomada de decisão, a comunicação deveria ser um mediador do diálogo transparente da gestão pública e atuação política com a sociedade. Entretanto, ela funciona como um cabresto de influência com uma narrativa viciada em prol de um personagem e não do público, revelando deste modo um dos riscos de personalizar a política.


A mídia (meio) exerce então poder de controle e não de mediação na sociedade e a política (tudo referente a cidade, civilização e público) cada vez mais se restringe a artimanhas concernentes aos interesses de alguns personagens detentores de poder;poder esse concedido pela massa que o condena. E esse quadro não muda apenas com as recorrentes manifestações e rompimentos cíclicos na história da humanidade, pois eles caracterizam enas a transição de paradigmas como defende Kuhn e sua revolução científica. A mudança almejada no modelamento político da sociedade depende de um processo de “desaprendizado” como defendia Manoel de Barros em seus livros. Buscai as pré-coisas e vislumbrem um novo horizonte debaixo dos pés. Caso contrário, permaneceremos na dança dos títeres. Alternando apenas funcionalidades e paradigmas.

BOURDIEU, Pierre. Fonte: Le Monde Diplomatique – Il manifesto, via micromega Janeiro de 2012 / Tradução: Mario S. Mieli


GEERTZ, Clifford: A interpretação das culturas, Rio de Janeiro: Ed. Guanabara, 1989.


HABERMAS, J. Mudança estrutural da esfera pública: investigações quanto a uma categoria da sociedade burguesa. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro,1984.

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quinta-feira, 16 de fevereiro de 2017

sutil




O pássaro. Uma família, Trochilidae. Várias espécies; várias flores. Lábios a serem beijados como versos a serem traçados. O segredo do beijo, o segredo do voo, o mistério do olhar. Ele encanta pelo que é, pelo que faz e me faz. O amor em letras é carne dos versos desse dorso, corpo poesia.

O peso. O dia que não se explica, mas embarga o choro. O pensamento; o gesto que a palavra não suporta, não carrega e nem traduz. Sutil, ele segue seu voo.


segunda-feira, 13 de fevereiro de 2017

climáticas mudanças


Alternância conceitual, sensações dançam em um frenético ritmo, o do silêncio. A mudança. Felicidade. Busca. A inquietação alimenta estigmas da humanidade que pulsam na iminência de encontrar a peça que lhe falta no quebra-cabeça. Uns vivem ignorando este fato, e se atêm às praticidades da vida (seja por necessidade - princípio básico de foco na sobrevivência - ou por simples alienação pelo conforto de apenas fluir), outros enlouquecem a percebê-lo. E sempre há os que transitam pela cidade das sombras sabendo a verdade de Shell Beach, mas ainda querendo refrescar-se nela.

Calmas águas levam sentimentos para o mar. Terra, peixes, madeira e algumas estrofes despedaçadas. Ele não sabia que parte dele também ia naquele rio. Parte que ele nem sabia que dele um dia já foi.

Sorrisos trincados rompem o horizonte. A sala se enche de uma expectativa morta, de uma sensação estranha de esmagamento, a partir de dentro. Os olhos indicam um coração espremido. Prestes a transbordar, o olhar toma as rédeas dos pensamentos e alça voo.

Sutil como um raio rompe o céu. Algumas situações fazem estrago pela sutileza que carregam. O estrondo posterior apenas é lamúria fúnebre de uma emoção sepultada, de um agonizante sentimento que outrora pujante exalava beleza.

De todo o papel gasto, que palavras faltam? Quais sobram? O amor posto à prova, perpassa chuva, sol e desconstruções. Se morre, era mesmo ele amor? ou ensaio? se vivo, permanece o que há de ser? "O amor, quando nasce, só vê a vida, o amor que dura vê a eternidade". Victor Hugo in 'Carta a Juliette Drouet'

Climáticas, mudanças despontam no horizonte. Brilha.


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quinta-feira, 2 de fevereiro de 2017

Conteúdo Social - as narrativas pulsam


Uma matriz de conceitos rege organizações e até mesmo confunde gestores em uma promessa de êxito de fluxos complexos em busca de transparência, que aparentemente deveria ser o resultado de processo simples. Matriz de risco, sustentabilidade, responsabilidade social, engajamento profissional, territorialidade, compliance, stakeholders, brandend content e tantos outros.

Richard Edelman, referência em Relações Públicas, com graduação e MBA em Harvard, afirma que “Ganhar dinheiro apenas já não é o suficiente; é preciso também melhorar ativamente a sociedade. As organizações têm a obrigação de demonstrar altos padrões éticos e provar continuamente que não estão interligadas de forma indecorosa com líderes do governo”.

Percebe-se que os padrões éticos de uma corporação devem estar refletidos em suas narrativas não de forma engessada, mas de forma que os empregados da empresa absorvam e reproduzam o discurso da empresa se apropriando dele como seu. Brandend Content e as novas nuances midiáticas interferindo ou se adequando ao fluxo social contemporâneo. O modo como as pessoas se relacionam com a comunicação, na geração e absorção da informação e criação de sentidos exige novo modelamento. Em um ritmo frenético entre acessar e produzir conteúdo, o usuário não se permite a intervalos, dar pasto a vista em comerciais. Então o conteúdo de marca surge como possibilidade, mas não pode se estabelecer como no filme O Demolidor (1993 - Dir. Marco Brambilla) onde os jingles (em seu formato original) se tornaram produto cultural, suprimindo conteúdos.

Deste modo, o conteúdo passa a ser o novo subproduto das corporações. Uma espécie de venda casada que impulsiona o consumo, a venda e a absorção da mensagem. A partir de narrativas que remetem à raiz e história relevante para o público alvo, os conteúdos devem ser elaborados a partir da transparência, legitimidade, qualidade e irreverência, para que o indivíduo perceba que se trata de um conteúdo de marca, mas que aquela narrativa apresentada o proporciona uma reflexão ou um dado relevante para seu universo particular. Além de um produto, a moral da história. Por meio do conteúdo de marca a empresa espalha sua missão, vende seu produto e busca se integrar à sociedade de forma igualitária.

O conteúdo de marca amplifica as ideias além dos produtos. Essa narrativa trabalha sobre as premissas Desejo, Necessidade, Vontade; como no final da música dos Titãs “Comida” (1987 - composição de Arnaldo Antunes/Sérgio Brito/Marcelo Fromer).

O marketing então nesse cenário, assim como o jornalismo, se coloca no lugar das pessoas como uma delas, de forma verdadeira, fazendo a diferença na vida das pessoas a partir dessa ambientação. As narrativas são ambientadas, regionalizadas sem perder o link com o macro universo da sociedade. Semelhante foi feito no cinema com o livro de Ismail Kadaré que fala do Kanun, um código de lei de origem patriarcal que prega um loop eterno de vinganças e foi adaptada em Abril Despedaçado (2001 – Dir. Walter Salles) regionalizando a questão que aqui também se encontra. Essa dinâmica, quando aplicada por corporações, alavanca aceitação de conceitos, interfere em comportamentos sociais, dentre eles o consumo, favorecendo venda de determinados produtos.

O jornalismo assim permeia vertentes que podem representar uma nova ordem na organização da profissão e interferência na sociedade. O jornalismo também como instrumento para elaboração de um correto conteúdo de marca, que não se aprisiona na publicidade de convencer, mas no conteúdo de promover reflexão, interferência e poder de escolha; conviver. As narrativas pulsam, perpassam plataformas e linguagens e padrões sociais. Percebem a pessoa como indivíduo e sujeito social. Instigam e acalentam.

Pode-se afirmar então que essa narrativa conduz a interpretação do público, educando-o para relacionar o conteúdo não apenas a uma marca, mas a um padrão social que transcende paradigmas e valoriza ainda a cultura.

Para viabilizar o acesso frenético da geração contemporânea o streaming estabelece um novo modelo de consumo de dados. Milhões se entregam a este serviço como única ferramenta (Netflix 80 milhões de assinantes, Spotify 40 milhões, Apple Music 17 milhões). O streaming é o poder do instante. Vale mais o agora, o “enquanto eu acesso” do que o download. A apropriação do conteúdo muda. Não é preciso ter o arquivo, a informação, o produto, mas poder acessá-lo quando e como quiser. Assim percebe-se como se alastra o perfil colaborativo de mídia, criação e gestão de dados, e também de espaços (ex: escritórios Co-working).

O Youtube está para o mundo o que a Rede Globo foi para o Brasil durante décadas. Janela da realidade. No entanto, a grade livre do youtube é um ciclo que oscila, revoluciona e permite que cada um produza e consuma o que quiser, como quiser de onde estiver. Aparelhos filmam com qualidade, publicam e distribuem dados com rapidez. A produção barata impulsiona lucros.  Todavia, uma nova configuração de cobrança aponta nuances de um mercado jovem (internet) que reorganizou o modo de fazer negócios, de fazer política, de comunicar, de ser sociedade.


Narrativas palpáveis que entregam sentidos e promovam envolvimento. Assim, seja por streaming ou por conteúdo de marca, a comunicação segue atualizando formatos, plataformas e linguagens, alternando padrões e fluxos em busca de interligar seres humanos e mensagens.

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ao passar


Quando passar por mim, não me deixe seus poemas. Esses versos de quinas afiadas que rasgam o que toca. Quando me tocar, leve mais que meu perfume, deixe mais que seu sabor. Não permita que o suor das minhas ideias mudem seu gosto, outrossim misture-se. Seja.

Quanto tempo leva o tempo ninguém sabe ao certo. Mas o vento que passa deixa mais do que se leva. A leveza de um olhar, a doçura de uma voz, a força de um amor que sobrepõe lógica, regras e rimas.

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Ouço os pássaros ocupando a faixa no ar que lhe pertencem para comunicar. Ocupo meu lugar na rima, com os olhos voltados ao vento que afaga minha face, que sussurra em meu ouvido que algo partira, em todos os sentidos.

segunda-feira, 23 de janeiro de 2017

Novomesmo



Se todas as possibilidades na ordem e relação das forças já não estivessem esgotadas, não teria passado ainda nenhuma infinidade. Justamente porque isto tem de ser, não há mais nenhuma possibilidade nova e é necessário que tudo já tenha estado aí, inúmeras vezes. (Friedrich Wilhelm Nietzsche) .

Felicidade. Satisfação. O ser humano vive em busca disso. A sensação de estar satisfeito com a vida independentemente das circunstâncias, ser feliz. Para alcançar este estado, as pessoas definem os meios, muitos até o fim. O ser humano então pode ser compreendido como um animal que se move pelo interesse. Coloniza territórios e grupos socioculturais. Entretanto necessita de limites / fronteiras, físicas e psíquicas; do muro, portões, grades, paredes, até mesmo a roupa no corpo e uma ideia na cabeça.

A organização de um povo em sociedade busca viabilizar os fluxos entre demandas e anseios. Entretanto, a mão forte de um interesse muitas vezes sobrepõe os fluxos, desencadeando em conflito social. O Conflito social é o ponto de tensão para reorganização de uma sociedade e seus parâmetros de desenvolvimento e gestão. O pensamento político para ser eficiente deve conceber de forma madura o conceito de público, privado e compartilhado. Aplicando assim técnicas de gestão por resultados e equilíbrio orçamentário (como a iniciativa privada) tendo como beneficiário a opinião pública e o povo representado. Assim, a entropia gerada pelo conflito social viabiliza a ordem social. O sistema democrático é ineficaz em garantir satisfação do povo; ainda “amador” o sistema estaciona em uma entropia que mantém alguns fluxos definidos e conceitos e regras divergentes.

Neste cenário, instaura-se o populismo (em sua versão remodelada ou original) como mecanismo de gestão de uma massa que prefere o desenvolvimento estável e acesso a poder de consumo do que a democracia (fato recentemente constatado em pesquisa da Organização das Nações Unidas (ONU) e do Estudo eleitoral Brasileiro (ESEB), mostrando que 62% da população estão insatisfeitas com a democracia e abriria mão da mesma por estabilidade econômica e social.).

Percebe-se assim que a sociedade não sabe o que fazer com a liberdade e poder que o processo democrático concede ao sujeito. O sistema político gera insatisfação, todavia a burocracia para a participação popular faz com que as pessoas fiquem estagnadas no trono da reclamação sem agir por meio dos mecanismos democráticos de pressão à gestão pública. O governo populista (do Estado Novo ao Golpe Militar) é marcado por aspectos como o carisma, a demagogia, o assistencialismo, principalmente em relação aos trabalhadores. Revolvendo-se a memória popular constata-se: No Brasil, o líder populista de relevância foi Getúlio Vargas (1930 – 1945/ 1951 – 1954), tendo a Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT) como maior legado, que formaliza na mão do Estado os direitos do trabalhador. A execução da famigerada política do pão e circo representa bem essa estratégia de governo que busca dar à população a ideia de confiabilidade, proteção, direitos garantidos e atendimento dos anseios coletivos e individuais. As ações populistas independem dos governos de direita ou de esquerda (em lados opostos, épocas diferentes, mas populistas: Getúlio, João Goulart e Leonel Brizola, Jânio Quadros, Carlos Lacerda, Ademar de Barros, Juscelino Kubitschek), mas amparam-se em personagens políticos e desdobramentos do respectivo modelo de gestão. Entretanto, é possível perceber uma incoerência no que tange a algumas práticas arbitrárias, que demonstram um progresso pautado pelo autoritarismo e supressão de direitos civis (disfarçada de proteção da tradição popular). A aparente inclusão social populista de certa forma alimentava a demanda que se propunha atender, em um processo alienante de promessas de construção de uma nação promissora, e pequenas ações efetivas.

A população durante muito tempo não soube identificar que estava sendo imersa em um sistema de configuração política alienante. Eleito era quem se destacava em carisma, ações assistenciais, demagogia e não em histórico e experiência política. Partidos políticos e programa de governo não eram decisivos no processo eleitoral.

"Mesmo dando a ideia de que os líderes populistas fossem “irresistíveis” não podemos deixar de dizer que certos grupos políticos também fizeram forte oposição a esses líderes nacionais. O crescimento populacional brasileiro e a abertura dos novos desafios conviviam com a polarização da política internacional, que dividiu as nações do mundo entre o capitalismo e o comunismo. Desta forma, grupos ultra-conservadores e setores de esquerda encontravam-se em pontos longínquos do cenário conciliador do fenômeno populista brasileiro. Comunas” e “reaças” eram representantes de uma tensão política que colocou, nesse mesmo período, a democracia em xeque. A ascensão da Revolução Cubana, em 1959, trouxe medo e esperança a diferentes grupos da nossa sociedade. Ao mesmo tempo, grupos militares instituíram a urgência de uma intervenção política que impedisse a formação de um governo socialista no Brasil. Viveu-se em uma economia que sabia muito bem promover a prosperidade e aumentar a miséria. Foi nesse momento que, durante o Governo de João Goulart (1961 – 1964), os movimentos pró e anti-revolucionários eclodiram no país. A urgência de reformas sociais viveu em conflito com o interesse do capital internacional. Em um cenário tenso e cercado de contradições, os militares chegaram ao poder instaurando um governo ferrenhamente centralizador. Em 1964, o estado de direitos perdeu forças sem ao menos confirmar se vivemos, de fato, uma democracia "(Rainer SOUSA).

O sociólogo Francisco Weffort defende que o populismo atua de duas formas ambíguas: como estilo de governo com interesse em atender pressões (demandas) populares e como política de massa forjando a ideologia de governo de forma autoritária. Neste contexto, o Chefe de Estado se confunde com o próprio estado sob o qual a massa se submete sem poder de questionamento ou interferência. O líder se faz protetor e algoz do povo. Este sistema no Brasil pode ser verificado até o fim da década de 70, mas a variação desse sistema, o novo populismo desencadeado a partir de 1980 carrega a essência e apenas varia nas plataformas de execução e controle do populismo.

O neopopulismo (1980) veio com o limiar da Globalização e flexibilização das fronteiras. Neste período, a privatização tão criticada, que surgiu como estratégia para redução da dívida pública, aponta incoerência do comportamento social. Esse último acreditava que o desenvolvimento econômico sobrepõe opinião e direitos sociais. O Neopopulismo, aliado a um neoliberalismo, gerou polêmica a adesão gradativa no país, com pontos de absorção espontânea pelo mercado investidor. No entanto, os diversos casos de corrupção do alto escalão da Nova República, envolvendo diversos patamares do Governo, aliada à frustração social das promessas de governo do então Presidente Mauricinho (Collor), fez com que Collor fosse afastado em 1992. Um marco em 1994 (Plano Real de Fernando Henrique Cardoso) e derrocada em 1998 (Instabilidade econômica e social de FHC). Diante deste cenário, faz-se relevante considerar o pensamento de Durkheim a respeito da adaptação do indivíduo ao meio diante dos fatos sociais (e suas características concernentes a Generalidade (padrão comportamental e de pensamentos comuns), Exterioridade (Fato intrínseco no indivíduo) Coercitividade (obrigação, papel social do indivíduo). Em sociedade, o indivíduo enquanto sujeito se mobiliza por ideologia (imposta ou trabalhada via agenda setting* ) e assim estabelece grupos sociais. As interferências desses grupos na organização social levaram o Estado a se reorganizar, saindo de uma posição ditatorial, para uma postura dita neoliberal, instituindo um neopopulismo.

Em sua obra, Durkheim aborda o Estado como órgão e o instrumento de uma nova sociabilidade, protegendo e regendo a sociedade rumo a um desenvolvimento. Considerando sua argumentação de que o indivíduo possui duas consciências (Individual e Coletiva) pode-se verificar pelo contexto social, que o populismo e neopopulismo atacam a consciência coletiva e a manipulam a partir de nuances percebidas de uma consciência individual adormecida.

Neste cenário, importante considerar as leituras de sociedade que fazia Zygmunt Bauman, com a sociedade da liquidez. O ser luta para ser humano em um cenário de valores e conceitos flutuantes, não perenes. A pressão por constantes mudanças favorece a cultura do esquecimento, onde tudo o que deveria permanecer e gerar marcos no desenvolvimento humano se liquefaz. A tecnologia neste contexto é um facilitador que superficializa a reflexão humana e seus padrões culturais. Paira no ar uma sensação de desconhecimento e fragilidade.

Contudo, o neopopulismo utiliza instrumentos que estabelecem na comunidade uma falsa sensação de liberdade e poder. O empoderamento e engajamento tão recorrente em discursos contemporâneos. No entanto, a consciência individual dos sujeitos parece chegar a um ponto de tensão, fato que evoca interferências na consciência coletiva e desdobra na divisão social do trabalho, com remodelamento dos papéis, mantendo a vanguarda em uma incógnita. O que farão os governos para conduzir a massa; quais as novas estratégias ou modelo? O que farão os sujeitos sociais enquanto indivíduos? Qual a configuração social do provir?

Referências:
NIETZSCHE. Obras Incompletas – Coleção Os Pensadores: seleção de textos de Gérard Lebrun; tradução e notas de Rubens Rodrigues Torres Filho; posfácio de Antônio Cândido – 3ª edição. São Paulo: Abril Cultural, 1983. p: 387 a 397.

SOUSA, Rainer Gonçalves. "O regime liberal populista"; Brasil Escola. Disponível em www.brasilescola.uol.com.br/historiab/o-regime-liberal-populista.htm. Acesso em 19 de janeiro de 2017

DURKHEIM, Émile. Lições de Sociologia – a Moral, o Direito e o Estado, 1969 - Editora da Universidade de São Paulo, 2ª edição.

*Teoria formulada por Maxwell McCombs e Donald Shaw, o Agenda-setting consiste na hipótese de que a opinião pública considera mais importante em seus assuntos diários os temas que são veiculados com maior destaque na imprensa; sendo que as notícias veiculadas e o foco das narrativas são determinados conforme singularidades de quem detém o controle dos veículos de comunicação ou até mesmo a setores de uma sociedade.

Publicado também em minha página no © obvious: http://obviousmag.org/rumos/2017/01/novo-do-mesmo.html#ixzz4WZxxHk8Q


segunda-feira, 16 de janeiro de 2017

(P) isca




Imagens diversas de um cotidiano que encanta e cansa apresentam nuances diferentes da personalidade humana e sobretudo uma característica comum: busca por reconhecimento.

- [ ] Não a famigerada procura por fama, mas a essencial busca por um olhar do outro que valide o comportamento e a vida de um indivíduo. Fotos nas redes sociais, notas em diários, conversas com desconhecidos na fila, no ônibus, no mercado; a dinâmica de entrosamento no bancos de igrejas, de escolas, o refeitório de empresas, os olhares de elevador. O ser humano e a busca pela validação de sua existência. Nesse processo, fere, é ferido, transforma seus objetivos em escudos de uma fragilidade de olhar a paisagem, e ignorar sua beleza ao insistentemente tentar registrá-la. A melindrosa caminhada pela superfície de dentro, essa terceira margem do rio que nos fazemos, crendo em um desaguar no horizonte.

As perguntas impulsionam. "Desejo, necessidade, vontade e representação", o humano a lutar assim para obter reconhecimento. Reconhecer-se além da imagem invertida no espelho, das fotos e traços. Reconhecer-se além da significação de seus gestos. Estar em sociedade, em saciedade e não na miséria (emocional, física ou espiritual). Conhecer limites e fronteiras, sem deixar de compreender os aspectos da flexibilização (famigerado bom senso). Participar da paisagem, sabendo que para haver centro, há margem. No entanto, quando há fluxo social que promova integração de direitos, deveres e acessos centro e margem são apenas pontos de referência oscilantes, conforme instante e viés que se observa tais fluxos. 

A caverna nunca foi tão grande e multifacetada, e as sombras nunca fascinaram tanto o olhar como agora. Onde paira a liberdade? Aprender novamente a conhecer e reconhecer. Sendo.