sexta-feira, 23 de junho de 2023

farol


O paradoxo da busca do que não se tem pleno conhecimento do que é mas apenas do que pode ser. Cada indivíduo com sua ideia de verdade, seus valores e um nível oscilante de energia de viver. A interação das gerações contribui para tratamento da ansiedade, da frustração e também renova o olhar de quem acha que já chegou ao fim.

Mais do que manchas nas paredes, nos papéis e fotos em álbuns; a história deve ser contada e revisitada constantemente, como uma maneira de expurgar toda a melancolia das incertezas e das lembranças que o indivíduo precisa que sejam soterradas para além do subconsciente.

A maneira como a sociedade comprime indivíduos e os conduz à morte é cruel. O desespero inevitável. Depois dele, apenas o silêncio aguardando o impacto. Corpo e cifras. Carne sobre ossos com cores e cheiros diferentes, com índice de massa corporal diferente. Pedaço de papel, bits e bites, metal em rodelas. Valor agregado. Desejo por desejo. A essência do instante. Se perder a virilidade, o dinheiro, perde valor. Se perder a exuberância, a juventude, a sensualidade, perde valor. A existência do descartável. Comprar, usar, sentir, descartar, gerar lixo. Lixo que some após algum tempo na calçada, misteriosamente. Os mistérios sociais, quando se ignora os processos para ficar em utópica paz. Cria-se, apropria-se, pira-se pelo bel prazer de se sentir correto, limpo, puro, acima da média, referência. O preço dessa postura social é cobrado agora a curto prazo. A fuga é o eterno retorno.

Seus pés calmamente atravessaram o cascalho e chegaram perto daquela porta de ferro que rangia, daquelas paredes de um concreto cansado. O farol não se mexeu. Ficou ali mesmo após anos de isolamento, de golpes do vento, das ondas e olhares. O farol permaneceu. Sua escada em espiral revela o DNA do abandono. A ação da paciente maresia. Que sons atravessavam aquelas paredes? O ressoar era diferente, como a imagem que refrata. A luz há muito não entrava naquele lugar. Suas mãos destruíram teias complexas de aranhas magras. A poesia do seu corpo pesado marcava versos na poeira. Rastros de novos tempos.

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