quarta-feira, 8 de fevereiro de 2023

nervuras


Ser uma pessoa melhor. Frase surrada no para-choque de um caminhão que tenta romper cascalho, terra, asfalto. O leva e traz de necessidades, atendendo as demandas salutares. O sol destaca contrastes que a lua alivia na madrugada.

Falhamos na missão de sermos melhores, mas obtemos contínuo êxito na tarefa de gerar esperança. Na suavidade de uma folha que se desprende do galho e plaina ao chão, aprendemos que é a esperança que move os dias e as relações entre as pessoas. 

A textura dos dias, das estradas. As folhas e suas nervuras, os rostos. Rugas rasgam a derme cravando no silêncio experiências. Ainda assim nos distraímos com a esperança, com as cores, rimas e sons. O beija-flor enigmático lança seu olhar e faz seu voo levando a lemniscata pelo vento em uma poesia sutil.

Ocupamos espaço e tempo com nossas narrativas que muitas vezes são releituras de instantes e até mesmo de outras narrativas.  Repetição, ou apenas repasse. No entanto, os objetivos e necessidades se renovam?

Era a foto não publicada da palavra não dita, do toque que arrancou suspiros mais sinceros e sublimes. Era possível sentir a leveza, a membrana, o peso. As pessoas lá fora. Fora. Era complicado. Ninguém enxergava o outro. Encontrar com quem conversar de forma sem amarras, sem o malhete, tornou-se tarefa rara. Entremeio a tanta narrativa elaborada por algoritmos e distribuídas por outros, tornou-se ainda mais difícil coexistir.

As cifras e cifrões passaram a delinear a sociedade que sucumbiu à atrofia, confundindo com liberdade. Sentados sobre narrativas que desconhecem origem e propósito, muitos arrotam uma autoria utópica de um argumento que corrói a vida com um sorriso. 

Ainda há céu e jardim para os colibris.



segunda-feira, 30 de janeiro de 2023

imagens



Criadas pelos mais diversos ângulos. Perspectivas tensionadas não mais apenas em lentes de robustas mas na imensidão de lentes de smartphones. Nos designers, o uso exacerbado de banco de imagens faz algo engraçado acontecer: imagens repetidas em campanhas de segmentos e público diferentes, e em tempos diferentes. Agora, dentre as mais diversas aplicabilidades, as ferramentas de construção de imagens por meio de inteligência artificial instrumentalizam mentes criativas com a facilidade de criar imagens base necessárias em criações. São tantos que surgem, como o DALL-E, Stable Diffusion,  Midjourney, Craiyon e Nightcafe Studio. Daqui a pouco, cada vez será vivenciado a artificialização do conteúdo. Bem argumentado em artigo de Altair Hoppe. Desdobrando esse raciocínio, podemos dizer que o algoritmo então deverá rever critérios de distribuição para favorecer o que é orgânico, realmente capturado por lentes controladas por humanos.

Estamos em uma moderna torre de Babel. As pessoas não se entendem, nem se esforçam para. Quando o fazem, é com a motivação equivocada. A narrativa adentra em um aspecto que se assenta no eterno retorno a uma questão elementar: o que é real?

Os laços no céu com o vento se contorcendo. Panos rubros, brancos e azuis. O corpo entre as curvas do tecido erguido, se mantém firme em manobras delicadas. Ela dança no ar. O violino, o piano, o ar que abraça e conduz o olhar para aquela que para o tempo, enquanto paira no ar. Puro encanto de luz, sombra, contorno dos sons dentro do meu olhar. 


Imagem feita pelo DALL-E
Imagem feita pelo DALL-E


segunda-feira, 23 de janeiro de 2023

conhecer



Imagem e reputação constituem o brasão de uma comunicação corporativa que busca se renovar e se manter em tempos tão volúveis dos significados e significantes da sociedade. A construção e defesa vão além dos comportamentos dos indivíduos, mas essencialmente em qual e como a mensagem circula pela sociedade. 

Sua empresa precisa ser conhecida por todos? Seus produtos precisam estar em todos os lugares? Ou ela tem um público específico, um potencial de atendimento limitado? Conhecer sua marca, as entranhas dos processos de produção ou estruturação dos serviços permite que você defina, a partir do plano de negócios, o perfil que a comunicação deve ter, o ritmo, a linguagem, as plataformas utilizadas, o orçamento de custeio e o potencial de investimento. Afora isso, é tentar copiar os colegas de outros setores, outras mídias, com outros perfis e até mesmo em realidades paralelas.

O reconhecimento do indivíduo precisa do ambiente externo para validar o interno. Na comunicação, a marca precisa ser exposta e reconhecida (sua mensagem e seu significado) mas apenas para seu público-alvo. É um raciocínio obviamente lógico, mas que em tempos de modernidade exacerbada, muitos procuram uma audiência que não suporta, que não agrega e que desconstrói a imagem e a reputação da marca. Neste cenário, a análise dos dados e a famigerada mensuração de performance de comunicação exige técnica, visão apropriada a respeito de todo o contexto, para assim melhor orientar os clientes e posicionar a marca.

quinta-feira, 19 de janeiro de 2023

escorreu



E o que vem a ser o propósito? Se esquivar da essência com a distração de observar o outro? Entregar-se ao ócio, ou apatia em relação às demais pessoas e perceber que é cativado ou pela dor, ou pela posse e vivência de situações e objetos prazerosos? Ter dinheiro, vivenciar o que o dinheiro possibilita.

Na criação de filhos, a criação de templates para fantasias sua boa imagem externa de bom pai e mãe? Nos escondemos todo o tempo, nos esquivamos do que é essencial para fazer saltar aos olhos os elos dos algoritmos que criamos para termos mais tempo para ser, do que ter.

No desespero de proteger nossa hipocrisia, machucamos quem dissemos tanto amar. macucamos e nos isolamos. Embora fiquemos comovidos com enredos apaixonantes de união, aproximação e valorização do outro.

Não sabemos o que fazer com o tédio e imputamos a ele a perdição, a atrofia dos sentimentos, a individualização. Somos seres banais se julgando donos de verdades, de julgamentos, de condenações.  Não enxergamos, não mesmo, nossas interferências na vida das outras pessoas. Não controlamos, de forma alguma, a maneira como vão interpretar e reverberar nossas palavras, nossos gestos.

Quando tentamos ficar fora desse padrão velado como liberdade, sofremos por entender estarmos deslocados. Não somos dessa rua, estamos de passagem; entretanto não controlamos nem o piscar dos olhos.

O que vem a ser esse famigerado ao peito. Que nos faz guerrear, plantar e incendiar. Romper a alvura em versos e rasgas as mágoas ao travesseiro de um lugar de paredes úmidas, de lençóis suados e de um eco ensurdecedor.

O que está atrás de tanto brilho. Tanta imagem clichê, tanta angústia e tanta euforia clichê? O que há de se revelar? As narrativas são como a pipoca no cinema. Nos racham os lábios. Comemos até sem fome. Sem perceber o gesto. Apenas repetindo. Reencontrar a inocência da infância. Mas é lá que está também o início desse se perder na contemplação.

Lembro da criança de pés descalços, no intervalo das brincadeiras, olhando o céu, ou o gramado, ou um buraco no muro, ou uma trilha de formigas. Atordoado como que deslocado. Era tão intenso estes instantes, que ele não consegui a compreender. Sua cabeça não desligava, parecia mais um cavalo selvagem fazendo hipóteses de tudo ao redor, olhando do específico ao geral, construindo argumentos no silêncio, alimentando uma coragem que enfrenta até mesmo a dor.

Então vinha a bola, o pique, os raios, a terra, tampinhas, figurinhas, poste, banho jantar, brinquedos, televisão e cama.  Perdeu a conta de quantos circuitos fechados, e também dos dias bons pela simplicidade. Mas eles passam. Assim como o vento do guardador de rebanhos. 

sábado, 7 de janeiro de 2023

Contra tempos


Ele sabia. Um minuto Durden. A perfeita contemplação do instante. Quando o nada circunda o tudo e as escolhas não aquecem mais o silêncio. Estou a ermo no tempo entendendo ser uma engrenagem dentre tantas. Movimento-me, perco só dentes e ainda assim me movo. Algumas lembranças tenho vergonha de ter até mesmo sozinho. Outras, gostaria de compartilhar com uma pessoa, que entendesse. O minuto passa.
 As cenas se sobrepões em um roteiro mais do que caleidoscópico, mas fabuloso de tão real.

Impiedosa, a chuva cai sem consciência. Apenas cai. Escorre e faz barulho. Lava e arrasta. Nutre e encharca. Os versos em concreto armado, as esperanças e as garantias de uma segurança que até a água, sem aviso prévio, leva.


A foto está no ângulo certo? Com a iluminação do impacto? Na perspectiva da emoção? Ela está exposta o suficiente? Ou perder-se-á como tantos instantes não contemplados da maneira que verdadeiramente o aproveita. O minuto às vezes esconde outro.


Tantas narrativas, desespero e paz. Tornei-me minha pior versão controlada. Raivoso como um cachorro amarrado, grunhindo como um animal ferido, barulhento como um trovão sem chuva, sem raio. Consigo ainda lembrar, desanuviando essa realidade, de quando eu fui um infante agradável, curioso e risonho. Tute.  Tão distante. Deixei que matassem uma parte de mim que tanto eu gostava. Deixei que matassem. Permiti que controlassem o que não deveria ter controle. Tornei-me refém do desespero seguro de quem maneja a vida com receitas, com o malhete social, com o que não cabe em mim. 


O piscar dos olhos lança mais que cílios ao vento. A estratégia não é confundir, mas revelar que a lógica não se opera pelos padrões estabelecidos a consenso. Ela é do indivíduo e não da massa. 


Cachoeira barulhenta de tantos olhares silenciosos. Nossas dores vão nas águas com as paixões. Às margens, amores-perfeitos florescem e então sabemos o que fica. Quanto tempo dentro do tempo. Passaram-me décadas dentro de um ano. Pensamos escolher e programar os dias, mas não é assim. Os dias nos escolhem, se colocam diante de nós e nos assistem.


Um minuto Durden, ele se permitiu viver de outra forma.




sábado, 24 de dezembro de 2022

Natureza morta

Palavras estagnadas, não conseguiram se formar e sair pelas cordas, tampouco alcançar a garganta. Menos ainda estabelecer-se em frase e assim quem sabe talvez fazer sentido aos ouvidos sem pálpebras que por perto poderiam estar no momento. Confiar nas coincidências e na providência é algo que beira a insanidade; um padrão de comportamento contrário ao padrão da maioria.

As narrativas das mais diversas plataformas de mídia transitam não mais por um fluxo bilateral de mensagens. Ele agora (há muito tempo) considera os fluxos semelhantes aos neurais, com suas grandes, pequenas e múltiplas redes de conexões. Um número alto e intenso de emissores, mensagens e receptores, com um tempo de processamento (assimilação e retenção da mensagem) menor do que em gerações passadas. Desta forma, as doenças emocionais tais como a ansiedade, passam a ser recorrentes e permanentes. Como fazer uma comunicação que não piore o cenário? Consciente de que não tem o poder de alterá-lo por completo, mas de ser a alternativa em um contexto tão avassalador e impessoal? Na comunicação pessoal é o desafio para se manter as relações familiares. Na comunicação corporativa, é a árdua ação de proteger uma marca, conduzi-la ao amadurecimento, e reverberar seu posicionamento e sua missão de forma efetiva e não apenas de fachada.

A impessoalidade não é mais de mensagens robotizadas, mas de narrativas sistêmicas programadas, de  uma espontaneidade forjada, veiculada em stories, grupos de WhatsApp, nos cartões de natal e aniversário ainda existentes, tudo velado como se fosse orgânico. Baterias sempre carregadas e olhares ávidos por ter sempre sinal. Verdades e pós-verdades incrustadas no comportamento cotidiano e então tudo passa a ser tido como natural.

E esse novo natural que se instaura na sociedade e confunde os referenciais, propicia ao conflito, à sobreposição e uma suposta evolução pela aniquilação do divergente e não a partir de um possível consenso e coexistência. Veladas de paz, as narrativas tornam-se ácidas, mesmo que silenciosamente, aumentando a fissura entre as famílias, grupos sociais e as bases culturais. Neste cenário, mais do que ter os sentidos apurados, saber utilizar a interrogação e as reticências para a ser um requisito de sobrevivência.

Havia uma árvore na floresta. Se comunicou com as demais pelas raízes, alertando a chegada de uma nova praga. No entanto, não tinha como correr. Centenária, com suas raízes espalhadas por todo o solo, ela sentiu o vento, absorveu dele um pouco de Co2, percebeu o percorrer dos últimos raios solares pelas suas ranhuras, folhas e galhos, sentiu o golpe, sucumbiu. Na queda, seus frutos foram longe. Foram também no bucho de pássaros. Suas flores forraram o solo de sua putrefação. Durante alguns anos, a sua memória era percebida pelo buraco na paisagem e pela maneira com que cada organismo se aproveitou do que dela restara. No entanto, não há canção que perdure, por mais que repita, o tempo. sempre ele, ou a percepção que temos dele. Pujante, a natureza morta abusa da paleta de cores e argumentos.


segunda-feira, 5 de dezembro de 2022

Contra


Trâmites aparentemente aleatórios delineiam a silhueta e as entranhas de uma sociedade prisioneira dos próprios conceitos, principalmente os que remetem a liberdade e felicidade. 


O poder. A maneira como é venerado, buscado e como atordoa quem o exerce (seja em qualquer esfera) representa a imaturidade dos indivíduos em serem entronizados; tanto na família, na empresa, na política, e em todas as etceteras


O dinheiro é o estandarte mais arraigado em boa parte dos indivíduos. Abraçam e se mergulham no dinheiro como Tio Patinhas. Quanto mais dinheiro mais sobre ele falam e pensam e menos  a respeito do que seria ser humano; afora as posses.


Não percebem, mas soa quase natural a dependência e o gozo que manifestam ao se relacionar com o dinheiro e o poder que vem ou se vai com ele.


Traços recorrentes podem ser encontrados em casa, nos jornais, portais e nas nuvens; que antes apenas eram alvo do abstrato das ideias e agora são o arquivo sem fim dos acumuladores que nos tornamos. 


Antes da chuva. Grupos sociais movimentam-se na máxima de sempre o bando julgar e focar em uma parte, como exemplo. Assim evita que cada um reflita sobre si e também sobre o real motivo de ainda serem um grupo.  As traves nos olhos. Os elos que regem a sociedade.


Já não são mais correntes, são argumentos que nos aprisionam. E os usamos como elixir de uma liberdade que machuca os outros; o diferente é perseguido, o reflexo do espelho.


Acostumados, passamos pelos dias sem cogitar a ideia de existir algo mais importante do que ter posse, de terra, de moeda, de razão, de imagem. Falamos muito dos outros para evitar de pensar em nós mesmos de uma maneira íntima, intensa e sem argumentos. 


A grama molhada sob os pés descalços era o refrigério de um dia agonizante. O movimento das asas em lemniscata, possibilitava parar no ar durante o voo, analisar a ideia contra o vento, e finalmente partir.


“Eu não te contei o que aconteceu de verdade. Só estando em minha cabeça para ver como foi sentir tudo. E ainda assim saber como foram tantos os alheios a usarem o malhete, e desferirem golpes dos quais nunca me recuperei, tampouco retribuí.” Armenon 



segunda-feira, 28 de novembro de 2022

aleatórias gotas



Nossa pequenez. Fiquei um tempo olhando ao ermo em busca de quem correspondesse. Será que tem alguém aí? Será que alguém tateia minhas linhas sem se perder, encontrando-me e se aliando a mim nessa caminhada?


As narrativas guiam as reflexões. Em tempos de uma multiplicidade de criadores, de plataformas, de argumentos embalados como verdade, fica tão sutil compreender se está pensando por si; pelo outro, por meio do outro, no tema que te interessa ou que lhe foi induzido, no seu tempo, ou a contento do outro. A sutileza… 


Escovando olhei sem pretensão para o único ponto em que respingou a água, antes de acontecer. O encontro do espelho com a pedra da pia, ali uma gota mudou a cor do rejunte. A aleatoriedade me fascina, mas também me sela em um momento de isolamento, um silêncio tumultuado pelas ideias pujantes de outrora. 


Ainda está aí você que não sei se está?  Os rumos das conversas têm outro objetivo que não marcar como nosso olhar transita no tempo?  As chuvas marcam o respiro dos dias, e aquieta o fulgor da noite.


Experimentei emburrecer. Parei com os noticiários, larguei as vistas dos assuntos por mais diversos e contemporâneos. Assim, me vi semelhante a uma ilha solta no oceano. Sendo afastada de tudo e de todos. Um pássaro em voo. Experimentei e posso dizer que vislumbrei a paz. Embora sempre o cotidiano me arrancasse da distância e me amarrasse à realidade que a sociedade aceita. 


Na varanda, ouvi chegar no telhado as primeiras gotas da chuva. Escandalosas na madrugada, pontuaram as primeiras notas de uma canção. Depois do susto, entendi. Que no roteiro sem protagonista não há espaço nem para anti-herói. 


Os limites delineiam a liberdade. A falta de limites é o caos. Não o romântico, mas o sem parâmetros. O que não traz conforto, pois somem-se as referências. Não há pessoa alguma preparada para ele, embora o tateiem. 


“É engraçado ver o que a vida te dá quando você espera o pior”, Chuck Palahniuk 


Encaixadas, as palavras são engrenagens.  As pessoas nem sempre percebem o movimento ao qual sucumbem. Por isso o silêncio ainda é a mais honrosa saída, pois ele não significa atrofia. Atitudes caladas pontuam a paisagem de vida, amor e esperança; além do que possa  ser o conceito. 


Encantadoras narrativas estão postas, outras, ainda estão por vir. 

quarta-feira, 16 de novembro de 2022

Farpas


Era um pássaro pousado no arame farpado. Era a esperança, o futuro ou o passado olhando o tempo. O cheiro do vento na terra molhada, o calor do sol alcançando entre as nuvens o rosto que se desgasta, se procura, não se estende. 


Há muito tempo deixei que fizessem de mim justamente o que nunca fui. Pois não há em mim totalidade, mas as partes que me foram possível manter ou reunir; enquanto estiver aqui.


Foi o meu olhar que bateu asas. Até sumir de minhas vistas; de olhos fechados acordo para outros pensamentos. 


As borboletas no meio do cinza da indústria das desilusões, tudo deixa uma cor de esperança neste dia tão triste tão denso e tão vivo. Vejo as árvores quietas e silenciosas, vejo o tempo observando os nossos erros. Vejo tudo o que acontece e me entristeço. Mas passo. Continuo a passar.


Então vem o estado matinal de contemplação, sentado vendo as linhas da realidade formando coisas diante dos meus olhos. Dentro de mim a inquietação agarrada à paz. Compreender os espinhos, sem esquecer da beleza da flor, da ternura das pétalas e do perfume sutil que em nós desperta todo o sentido de estar vivo.


Os filmes não  falaram sobre as dívidas com bancos, sobre a falta de tempo livre, sobre o peso do silêncio no peito. Não falaram sobre a velhice e as limitações do corpo. A cultura do desejo não preparou a sociedade para a frustração. Apenas instigou a figura do anti-herói e o espírito de constante revolta, até mesmo quando se conquista o objeto da revolta. 


Narrativas foram invertidas e as interpretações também. Assim como Éric Arthur Blair bem descreveu em 1984, a sociedade sucumbiu ao sistema que criou para viabilizar uma vida tranquila. As gerações então alternaram-se e a maturidade de agora não entende da memória de outrora. 


Chovia muito. O arame farpado balançava. Agora não eram pássaros, mas gotas pousadas, esperando pela queda. Não eram farpas, mas pensamentos suspensos. A chuva iria parar e assim os voos poderiam retornar.


terça-feira, 15 de novembro de 2022

acordes - do Gorilaz ao K-pop virtual


As tecnologias são desenvolvidas para facilitar a vida em sociedade. No entanto, esse facilitar geralmente está atrelado ao significado de dependência e escravização. Ou seja, a sociedade se torna escrava ou refém das tecnologias que cria para facilitar sua vida (faz lembrar o Wall-E), liberar mais tempo dentro das 24 horas do dia. São muitas as reflexões possíveis, nas mais diversas áreas da vida e também das profissões.  

Recentemente, com a girl band de K-pop Eternity acumulando milhões de visualizações online, o tema chama a atenção de maneira diferente (integração de inteligência artificial, do deepfake e das tecnologias de avatar). Não sei até quando as diretrizes éticas de Inteligência Artificial da União Europeia irão proteger as questões que tocam a humanidade. Uma banda estruturada por meio de inteligência artificial. Diferente do Gorilaz (que a banda ficava atrás da cortina e desenhos protagonizavam as canções. Gosto não se impõe e cada um tem seu repertório, suas afinidades, perfil de assimilação de mensagem e as devidas et cetera que compõem o respectivo padrão cultural.

A isenção do sofrimento (argumentada como uma das vantagens da inteligência artificial) e demais envolvimentos orgânicos no processo de criação cultural, muda a intensidade, reverberação, verdade e vivacidade das narrativas? A simulação é substituta eficaz em todos os sentidos? Sem falar na antiga e famigerada discussão sobre o que vem a ser real. Importante é estar atento, não ser omisso (alienado) ao consumir os produtos culturais e demais processos tecnológicos; a reflexão merece espaço, nem tudo pode passar no automatismo da vida da sociedade moderna.

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A noite entrega a madrugada com estrelas e também chuva. O gotejar remanescente marca o compasso de uma memória ainda acessível. Tão real, quanto ilusória. Todo mundo tem seu momento Sinatra. Vasculhe sua mente e encontrará alguma memória (nem que seja o filme dos Gremlins) em que uma canção de Sinatra ou de Erasmo ressoe.